Por Karolina Cardozo
Acredito que para levantar uma análise crítica acerca da conjuntura atual do espaço e no tempo em que habitamos hoje, na hora em que o relógio bate em uma pandemia, é imperioso que voltemos no passado de forma a não repeti-lo mas aprender com ele, de maneira que possamos entender as manifestações do espaço na “roupagem em que vestimos” como o Professor Milton Santos gostava de analisar. No entanto, o olhar sobre as cidades, se deve, sobretudo, não no que diz respeito a sua formação como causa das contradições e sim em como o modelo de produção capitalista articula-se sofisticadamente desnudando a roupagem perversa da exploração e da miséria.
O espaço geográfico como definição é considerado uma categoria de análise e sobretudo como objeto de estudo da Geografia. Essa categoria, por sua vez, abarca a totalidade que está em constante movimento como nos afirma o Professor Milton Santos. E dentro desse contexto, portanto, o espaço é abstrato como aquilo que abrange tudo e todos. Costa e Teixeira (1999) afirmam, “o espaço geográfico apresenta-se para a epidemiologia como uma perspectiva singular para melhor apreender os processos interativos que permeiam a ocorrência da saúde e da doença na coletividade.” (apud, FARIA, Rivaldo Mauro; BORTOLOZZI, 2009) Então, o que podemos dizer sobre a topografia social diante da COVID-19? O que o vírus nos convida a questionar sobre as contradições do espaço ?
Sem sombras de dúvidas, tem que existir uma perspectiva de analisar e entender os processos de adoecer como uma malha que se entrelaça na saúde-doença também como manifestação da organização do espaço. Quando voltamos na história, por exemplo, entendemos que a relação saúde e ambiente não é novidade. Por exemplo, a conjuntura do ambiente fabril durante a revolução industrial era insalubre e desumana e fez com que países tomassem medidas de caráter higienistas às práticas de políticas públicas. As ciências médicas, então, passam a entender o espaço social não de forma dinâmica, mas a enxergar relações de causa e efeito das doenças como interação do meio físico e social. Diga-se, de passagem, um pensamento um tanto quanto determinista que por sua vez vai ser superado.
Ao trazer o Professor Milton Santos para se falar de desigualdade socioespacial, é importante salientar e apontar as categorias de análises como ferramentas para interpretar manifestações espaciais. Sabe-se que historicamente, o conceito de território na Geografia foi pensando por meio da imposição de poder, na Geografia de Ratzel (1899) onde ele retrata o território como algo vinculado diretamente com o solo e com o espaço ocupado. No entanto, Para Milton Santos, o território sobretudo é o direito inalienável sobre seu uso, mas a disputa está sobre o seu uso como recurso ou como abrigo, e neste caso, nascendo as contradições.
Será que é óbvio que as maiores preocupações sempre giram em torno da existência humana? É justamente com o pressuposto da globalização que sabemos como um vírus não reconhece fronteiras. Mas, que globalização é essa que nos mostra as diferentes formas de morrer no espaço? Ou seja, uma manifestação coletiva de enfermidades nos leva a pensar que a doença é uma categoria de relações e de processos de mudanças espaciais. Assim, não somente pensar a enfermidade como um resultado patológico, mas como resultado da dinâmica socioespacial.
Referências:
FARIA, Rivaldo Mauro; BORTOLOZZI, Arlêude. Espaço, território e saúde: contribuições de Milton Santos para o tema da geografia da saúde no Brasil. Raega-O Espaço Geográfico em Análise, v. 17, 2009
SANTOS, Milton; SILVEIRA, Maria Laura. O Brasil: território e sociedade no início do século XXI. 2008.
SUERTEGARAY, Dirce M. Dirce Maria. Espaço geográfico uno e múltiplo. Scripta Nova: revista electrónica de geografía y ciencias sociales, 2001.
SPOSITO, Maria Encarnação Beltrão et al. Capitalismo e urbanização. 1988.
Karolina Cardozo é estudante de Geografia na UFSCar e bolsista do Programa Institucional de Iniciação à Docência – CAPES.
1 comentário em “Geografia: espaço e o contexto atual?”
Muito boa essa reflexão e relação do vírus com as fronteiras que a Karolina trouxe, ótimas bibliografias e referências. Gratidão por esse texto.