Os dez anos de O Estado e a revolução de Lenin

Por Evgeni Pachukanis, via Editora Sundermann, traduzidor por Lucas Simone

Originalmente publicado como: “Desiatilietie Gosudarstva i revoliutsii Lenina. Revoliutsiia Prava, nº 4, 1927.” Tradução original para o portugês disponível em: PACHUKANIS, Evgeny. A teoria geral do direito e o marxismo e ensaios escolhidos (1921 – 1929). Coordenação Marcus Orione, Tradução Lucas Simone. São Paulo: Sundermann, 2017

1 – Para uma história do surgimento do livro

Camarada Kamenev – entre nous, se eu for morto, peço que publique meu caderno: “O marxismo e o Estado” (ficou em Estocolmo). Capa azul, encadernada. Estão reunidas todas as citações de Marx e Engels, bem como de Kautsky contra Pannekoek. Há uma série de observações e notas. Formular. Creio que com uma semana de trabalho pode ser publicado. Considero importante, pois não somente Plekhanov e Kautsky confundiram-se…”. Assim começa a famosa nota de Vladimir Ilitch, escrita na época em que bandos de Cadetes do Governo Provisório andavam no seu encalço.

Assim foi preciso “preparar a edição” da obra que fez época tanto no desenvolvimento do pensamento socialista, como na doutrina sobre o Estado, e que, ao longo de dez anos recebeu centenas de edições, foi traduzida para todas as línguas estrangeiras e criou ao redor de si toda uma literatura.

O manuscrito do caderno azul continha o arcabouço do livro que viu a luz somente depois da Revolução de Outubro, com o título de O Estado e a revolução. É sabido por todos que seu texto definitivo foi escrito por Lenin depois das Jornadas de Julho, ele trabalhou sobre o texto quando escondido na cabana em Razliv2. Lá, Lenin uniu em uma só obra, os ensinamentos teóricos acerca do problema do Estado, fruto de seu trabalho meticuloso sobre as obras de Marx e Engels, e observações imediatas sobre o andamento da Revolução de Fevereiro, dos primeiros meses “de mel” da nossa república democrática. Os pensamentos fundamentais concebidos e introduzidos por Lenin no seu sistema ainda no exílio suíco, receberam, assim, uma série de ilustrações vívidas e plenamente contemporâneas. Ao relermos agora O Estado e a revolução do ponto de vista dessas duas partes constituintes do trabalho, ficamos surpresos com a maneira pela qual esse material ilustrativo, de origem mais tardia, coube como que sob medida nas linhas da análise de Lenin, elaboradas anteriormente. Os atores da Revolução de Fevereiro, dos cadetes até os mencheviques, como que propositalmente tentaram fornecer a Lenin uma ampla escolha de fatos que confirmavam suas posições fundamentais.3

O problema do Estado e da revolução atrai a atenção de Lenin já em 1916. A esse respeito, existe uma série de indicações em sua correspondência. Assim, na carta a Chliapnikov (setembro de 1916), Lenin, delineando os próximos objetivos teóricos escreveu: “na ordem do dia, estão não somente a continuação da linha dada consolidada entre nós (contra o tsarismo, entre outras coisas) nas resoluções e na brochura (essa linha foi notavelmente confirmada pelos acontecimentos, pela cisão na Inglaterra etc.), mas também depurá-los dos absurdos que amadureceram e da confusão da negação da democracia (aqui entram o desarmamento, a negação da autodeterminação, a negação “em geral”, errada, teoricamente, da defesa da pátria, a hesitação na questão do papel e do significado do Estado em geral etc. (grifo meu, E. P.)”.4

Por essa carta, fica evidente, entre outras coisas, o nexo concreto em que se colocou diante de Lenin a questão do Estado. Tratava-se ali dos debates e divergências que surgiram entre Vladimir Ilitch de um lado, e um grupo de camaradas, em especial Radek e Piatakov, do outro. Como se sabe, teve um papel central nessas divergências a questão do direito dos povos à autodeterminação (ver o artigo de Vladimir Ilitch, sobre o economicismo imperialista, direcionado contra Piatakov, e a áspera crítica do artigo de Radek a respeito da rebelião dos nacionalistas irlandeses). Foram debates dentro da ala internacionalista, dentro da esquerda de Zimmerwald, debates com camaradas que não levavam em conta a significação das revoluções nacionais na época imperialista, e que, por isso, compreendiam as tarefas da luta de classes do proletariado de forma demasiadamente simplificada.

Se observarmos de modo mais aprofundado, na base da discussão havia duas concepções distintas de revolução socialista. Os adversários de Lenin, que não compreendiam sua abordagem dos problemas nacionais e coloniais, partiam de uma compreensão da revolução socialista como um processo que deveria acontecer de maneira mais ou menos simultânea em todos os países capitalistas avançados – ou na maioria deles – e se desenvolver do mesmo modo. Nesse caso, as tarefas do proletariado vitorioso naturalmente deveriam se resumir, em primeiro lugar, ao esmagamento da burguesia e, em segundo lugar, à organização da produção socialista em escala europeia ou mundial. Com tal colocação do problema, surge uma série de problemas políticos – por exemplo, o problema da destruição do jugo nacional foi pura e simplesmente “suprimido”, pois a destruição das distinções de classe por si só deveria levar à destruição do julgo nacional: o lema do direito à autodeterminação foi declarado utópico para a sociedade capitalista e desnecessário para a sociedade socialista; a questão das fronteiras entre Estados foi resolvida de maneira muito simples, a saber, ficou presumido que essas fronteiras seriam instituídas de acordo com as “necessidades da produção”; finalmente, os oponentes de Lenin pura e simplesmente evitaram falar sobre o Estado socialista, elegendo em vez disso, a expressão indefinida “zona cultural socialista” (teses da oposição polonesa compostas por Radek).

Em oposição a essa ideia de uma revolução socialista simultânea e “pura”, Lenin desenvolveu sua concepção de acordo com a qual a derrocada do capitalismo deveria acontecer como resultado de uma série de batalhas de classe, guerras civis e entre Estados, com o que os ataques do proletariado contra a burguesia encontrariam apoio nos movimentos dos povos oprimidos coloniais e semicoloniais; nessas batalhas, o proletariado guiaria massas de muitos milhões de camponeses; a vitória do socialismo pode não acontecer e até certamente não acontecerá simultaneamente em toda uma série de países; finalmente, os caminhos de construção do socialismo em cada país, difeririam por particularidades relacionadas ao grau de desenvolvimento de um determinado país e seu passado histórico.

Sob tal perspectiva, a questão nacional e, por conseguinte a questão colonial, problemas ligados ao lema do direito à autodeterminação, adquirem uma significação imensa. A criação das formas políticas, que liquidam o jugo nacional herdado do passado e a desigualdade nacional, e que facilitam a união voluntária das nações, é colocada como uma tarefa independente; o proletariado não se pode livrar dessa tarefa e da formulação das exigências correspondentes. O direito à autodeterminação é um reconhecimento à nação oprimida da plena “igualdade em tudo, inclusive na construção do Estado, na experiência de construir o “seu” Estado”. Sob o capitalismo, escreveu Lenin, essa ‘experiência’ significa guerra, isolamento, limitação, o egoísmo estreito das pequenas nações privilegiadas (Holanda, Suíça). Sob o socialismo as próprias massas trabalhadoras não querem de modo nenhum esse isolamento por motivos puramente econômicos, e a diversidade de formas políticas, a liberdade de separação do Estado, a experiência da construção do Estado, tudo isso – antes da extinção do Estado em geral – será a base de uma rica vida cultural , a garantia da aceleração do processo de aproximação e fusão voluntária das nações” (XIX, p. 198).

A discussão sobre o direito das nações à autodeterminação ofereceu a Lenin a possibilidade de apontar concretamente certos traços de construção do Estado socialista e de colocar um problema que pura e simplesmente escapava à atenção seus oponentes, cegados por seu “economicismo imperialista”. Porém, no caso em questão, o problema do Estado foi tocado apenas por um lado, a saber, no plano da política nacional do proletariado. Restou a questão mais geral da relação da revolução proletária internacional com o Estado e do papel deste último. Também neste ponto, o motivo imediato que levou Lenin a uma elaboração aprofundada da questão foi novamente disputas em seu próprio meio bolchevique, em particular as divergências que se desenvolveram em 1916, entre Vladimir Ilitch e o camarada Bukharin.

Em cada acontecimento – e a redação de O Estado e a revolução por Lenin é sem dúvida um acontecimento de relevância histórica mundial -, existem aspectos que são reconhecidos por todos como fundamentais, capitais, decisivo; e, além disso, existem detalhes, traços secundários, que às vezes, escapam do campo de visão, mas que, no entanto, devem ser considerados para uma plena compreensão do objeto. Assim, é sabido por todos que O Estado e a revolução de Lenin constitui um golpe fulminante direcionado contra o social-reformismo e contra as tentativas, por parte deste último, de deturpar e vulgarizar os ensinamentos de Marx sobre o Estado, mas é muito menos conhecido o fato de que Lenin se dedicou a esse trabalho tendo em mente não somente a luta contra o kautskismo, mas também a retificação de erros que, eu sua opinião, N. I. Bukharin cometera em seus artigos dedicados a essa mesma questão do Estado. Podemos verificar quais são eles a partir da correspondência ora publicada de Vladimir Ilitch.

Na carta a Kollontai, de 17 de fevereiro de 1917, lemos “Estou preparando (o material esta quase pronto) um artigo sobre a questão da relação do marxismo com o Estado. Cheguei a conclusões ainda mais severas contra Kautsky do que contra Bukharin (viu a sua Nota Bene no nº6 da Jugend Internationale e no Sb. S-D.5 nº 2?). É uma questão de suma importância, Bukharin é muito melhor do que Kautsky, mas os erros de Bukharin podem arruinar essa ‘justa causa’ na luta contra o kautskismo”.6

Agora, tendo diante de nós tanto o artigo de Bukharin7, como a nota de Vladimir Ilitch na revista International Molodioji e o próprio livro O Estado e a revolução, vemos claramente a verdadeira dimensão dessas divergências. Desde o início, elas de modo nenhum foram tão grandes, como poderiam parecer pela carta supracitada; e no momento em que Vladimir Ilitch terminou sua obra O Estado e a revolução, ele mesmo reconheceu que as divergências se reduziram a nada.8

No próprio O Estado e a revolução, seria inútil tentarmos encontrar ecos desses debates. Toda a agudeza polêmica dessa obra foi direcionada exclusivamente contra o reformismo, contra Kautsky e o kautskismo. A velha disputa fora revogada: entretanto, voltar a ela é de certo interesse, sobretudo do ponto de vista de uma compreensão mais profunda da formulação do problema sobre o Estado que Lenin ofereceu.

Primeiramente, não há dúvida de que Bukharin estava absolutamente certo ao sublinhar, com todo vigor, a necessidade de destruição, de implosão da máquina de Estado burguesa. Nesse caso, as reprimendas de Vladimir Ilitch, de que Bukharin simplesmente repetia as opiniões dos anarquistas, que querem “abolir o Estado”, estão baseadas num equívoco. Bukharin indica, de maneira perfeitamente definida que, ao destruir o Estado burguês, os trabalhadores devem organizar seu próprio poder de Estado (a ditadura).9

A partir de todo esse contexto, fica claro que Bukharin trata da destruição justamente do Estado burguês, mas não do Estado em geral, de qualquer Estado, como entendem os anarquistas. Por isso, as objeções de Vladimir Ilitch, de que os socialistas, em particular Engels, diferentemente dos anarquistas, admitem a “extinção”, “o gradual fenecimento do Estado” depois da expropriação da burguesia10, evidentemente erram o alvo. Mas tendo sublinhado, de modo perfeitamente correto, o pensamento sobre a necessidade de destruição, de implosão da máquina de Estado burguesa, Bukharin, como aliás ele mesmo reconhece, desenvolve insuficientemente, nesses artigos, o tema da ditadura do proletariado, das formas pelas quais a ditadura se realizaria. Que a organização da ditadura do proletariado é a organização de poder de Estado, tal aspecto da questão permaneceu, em Bukharin, privado de qualquer conteúdo concreto. Por isso, nele poderíamos até mesmo ter que toda diferença entre socialistas e anarquistas, em sua relação com o Estado, resume-se a que os primeiros querem organizar a produção social de maneira centralizada, ou seja tecnicamente progressista, enquanto os segundos tomam por base formas econômicas descentralizadas, ou seja, tecnicamente atrasadas. Essa colocação do problema não apenas turvava a diferença entre anarquistas e socialistas, mas também desviava o problema político da ditadura para a área da economia, assim como a reflexão sobre a “zona cultural socialista” desviava do problema político da autodeterminação das nações.

Lenin apontou para esse erro em sua nota sobre a Internacional da Juventude e o tinha em mente quando escreveu, nas Cartas de longe: “A diferença entre marxistas revolucionários e os anarquistas não consiste apenas em que os primeiros defendem a grande produção comunista centralizada, enquanto os segundos defendem a pequena produção dispersa. Não, a diferença , precisamente na questão sobre o poder, sobre o Estado, consiste em que somos pelo uso revolucionários das formas revolucionárias de Estado na luta pelo socialismo, enquanto os anarquistas são contra”.11

O lado forte dos artigos de Bukharin de 1916 e seu mérito consistiam num duro posicionamento revolucionário sobre a destruição do Estado burguês. Seu lado fraco era o fato de que lá não fora, de modo nenhum, desenvolvida a parte positiva do problema, concernente às formas e tarefas do Estado proletário. Essa unilateralidade se fez conhecer mais tarde. Em 1918, Lenin, ao falar sobre a resenha do camarada Bukharin de seu livro O Estado e a revolução, repreendeu seu resenhista porque ele “enxerga as tarefas da ditadura do proletariado olhando para o passado, e não para o futuro”, ou seja, ele continua a frisar as tarefas de destruição do velho aparato, àquela altura em linhas gerais já realizadas, e não cita do livro de Lenin aquelas passagens em que, antes mesmo da tomada do poder, Lenin falava da instauração da disciplina, do registro e do controle, como tarefas do Estado proletário.12

Entretanto, a tarefa teórica consistia não apenas em provar a necessidade da destruição da maquina de Estado burguesa (embora isso fosse mesmo muito importante), mas principalmente em delinear, ainda que de maneira aproximada, a organização de poder que viria em seu lugar. Lenin não somente aprofundou e fundamentou sob todos os aspectos a primeira posição, mas levou até o fim a reflexão da questão das formas concretas da ditadura do proletariado. Ele colocou como base toda a grandiosa experiência histórica dos movimentos revolucionários do proletariado, em primeiro lugar a experiência da Comuna de Paris, e também as mais elevadas realizações do pensamento socialista que século XIX nos deu nas obras de Marx e Engels.

Observe-se um grandioso resultado que fez época no desenvolvimento da ciência sobre o Estado na mesma medida em que o fez a Revolução de Outubro na história da humanidade.

2 – Marxismo, bakuninismo e kautskismo

O Estado e a revolução de Lenin, num exame superficial, dá a impressão de ser um comentário marginal às citações de Marx e Engels. Imbuídos de um espírito “crítico”, os professores burgueses em tais casos adoram exibir sua jocosidade, comparando os marxistas com os escolásticos, que citam os textos e juram pelas palavras de seus mestres. Essa fraca ironia mostra somente que a ciência burguesa é incapaz de fornecer um sistema de concepção de mundo tão bem-acabado, íntegro e imbuído de um espírito verdadeiramente revolucionário como é o marxismo. Afinal, logo fica claro para qualquer um que se dá ao trabalho de se familiarizar com a obra de Lenin que não se trata simplesmente de uma “investigação acerca da história da ideia” da ditadura do proletariado, mas de uma obra política combativa, capaz de despertar pânico e fúria em qualquer representante das classes dominantes. E, no entanto, ela é de fato, construída sobre um estudo minucioso dos “textos”, contém inúmeras citações e referências ao pensamento de pessoas que passaram para a história. Mas a questão está exatamente no fato de que o pensamento de Marx e Engels trabalhou os mesmos problemas que agora a classe trabalhadora enfrenta; em seu coração havia as mesmas aspirações que agora inspiram os melhores representantes do proletariado. Lenin, ao restaurar os verdadeiros pontos de vista de Marx e Engels sobre o Estado e a ditadura do proletariado, não se propôs uma tarefa histórica e literária qualquer, puramente acadêmica. Ele pretendia fornecer ao proletariado contemporâneo uma amostra condensada e pura da experiência de luta das gerações precedentes, representada pela teoria de Marx e Engels, depurando essa teoria de todas as deturpações posteriores, livrando-a do peso morto que se acumulara ao longo de uma década de luta proletária legal, de adaptação ao capitalismo e às degenerescências reformistas.

Antes mesmo de O Estado e a revolução, em suas Cartas de longe, Lenin formulou sucintamente as principais conclusões referentes às formas da ditadura proletária. “Precisamos de um Estado”, escreve ele. “Mas não precisamos do Estado na forma em que ele foi criado pela burguesia por toda parte, começando pelas monarquias constitucionais e terminando com as mais democráticas repúblicas. É precisamente nisso que reside nossa diferença em relação aos oportunistas e kautskistas dos velhos partidos socialistas, que começaram a se decompor e que deturparam ou esqueceram as lições da Comuna de Paris e a análise dessas lições feita por Marx e Engels”.13 Ali mesmo, nas notas a essa carta sobre a “milícia operária”, Lenin dá uma lista das obras de Marx e Engels que ele acima de tudo tinha em mente: “Em uma das próximas cartas ou num artigo especial hei de deter-me mais detalhadamente nessa análise, feita, em particular, em A guerra civil na França de Marx, no prefácio de Engels à terceira edição dessa obra, na carta de Marx de 12 de abril de 1871 e de Engels de 28 de março de 1875, e também na completa deturpação do marxismo por Kautsky em sua polêmica de 1912 contra Pannekoek acerca da questão da assim chamada destruição do Estado”.14

Se compararmos essas indicações ligeiras com o texto de O Estado e a revolução, veremos que Lenin ampliou consideravelmente seu exame dos pontos de vista de Marx e Engels sobre a questão do Estado. Ele observou o desenvolvimento desses pontos de vista com base na experiência das revoluções europeias de 1848 e a Comuna de Paris, dedicando bastante espaço às questões da origem do Estado, sua essência e sua extinção em conformidade com a supressão das classes.15

Os primeiros cinco capítulos do livro de Lenin são dedicados à exposição da teoria coerente, harmoniosa e inteiramente revolucionária de Marx e Engels. Nesses capítulos, Lenin literalmente ressuscita as palavras esquecidas dos fundadores do socialismo científico. Ele mostra como o seu pensamento, ao generalizar a riquíssima experiência do movimento revolucionário encontrou formulações cada vez mais precisas e concretas.

Nas obras de Engels que datam dos anos 1890, há indicações diretas aos novos fatores que agravam particularmente o problema do Estado. Nesses novos fatores incluem-se uma virada para o lado do imperialismo, “a concorrência das conquistas” que, ligada ao aguçamento da luta de classes, fez com que os Estados capitalistas levassem ao máximo o poderio do aparato de Estado. Outro fator é o crescimento das tendências oportunistas em meio aos partidos socialistas, a aspiração de substituir o caminho revolucionário da luta de classes pela “integração” pacífica no socialismo. Engels, em carta a Kautsky de 29 de junho de 1891, vê nitidamente esse perigo do oportunismo e dá o alarme. “Esse esquecimento das grandes reflexões fundamentais por conta de interesses momentâneos do dia, essa perseguição de êxitos momentâneos e a luta por eles sem que se calculem as consequências futuras, esse sacrifício do movimento futuro em prol do presente, talvez ocorra por motivos ‘justos’. Mas isso é oportunismo e continuará sendo oportunismo, e um oportunismo ‘ justo’ talvez seja mais perigoso do que todos os outros”16. Essas inquietações de Engels e essas suas indicações do significado crescente do poder do Estado não persuadiram, no entanto, os teóricos da II Internacional, inclusive aqueles que tinham a reputação de reconhecidos guardiões da ortodoxia, a colocar o problema do Estado de maneira séria. O trabalho teórico realizado por Marx e Engels acabou sendo em vão; as formulações mais claras e agudas acabaram sendo silenciadas e simplesmente desfiguradas. O sexto e último capítulo de O Estado e a revolução é dedicado à caracterização desse “triste processo” de degeneração e decadência da teoria marxista nessa questão que o desenvolvimento capitalista levou à ordem do dia como a mais premente.

Marx e Engels forjaram seus pontos de vista sobre a relação da revolução com o Estado na luta e na polêmica com os bakuninistas e outras tendências anarquistas. Sua crítica da “negação” bakuninista do Estado é um exemplo de exposição revolucionária do problema. Em contraposição aos lemas anarquistas de derrubada de qualquer autoridade estatal, Marx e Engels, com base na lição da Comuna, mostraram que a revolta operária pereceu justamente porque se utilizou muito pouco do poder revolucionário do Estado, ou seja, recorreu muito pouco a esses mesmos “métodos autoritários”. Marx e Engels mostraram que a ideia anarquista da abolição do Estado é “confusa e não revolucionária”, que a prática que lhe é correspondente leva à dispersão das forças do proletariado, à derrota e, o que é ainda pior, à transformação da luta proletária em apêndice dos movimentos burgueses, como foi na Espanha.

Essa exposição do problema, constata Lenin, foi rebaixada pelos social-democratas atuais à “mais pura” vulgaridade pequeno-burguesa: “nós, dizem eles, reconhecemos o Estado, mas os anarquistas não” (O Estado e a revolução, edição de 1917, p. 59). O problema da revolução sumiu, foi deixado para uma exclusiva “elaboração” por parte dos anarquistas.

Ao mesmo tempo em que Engels, já em 1891, dá o alerta a respeito do perigo do oportunismo, Plekhanov, em seu livro O anarquismo e o socialismo, que veio à luz em 1894, polemizando com os anarquistas e, em particular, com Bakunin, revela a mais assombrosa superficialidade, precisamente nos pontos em que surge a questão da tática revolucionária e em que Bakunin lança algumas ideias das quais não se pode livrar-se com uma ou outra frase acerca de um “disparate puro e simples”. Assim, por exemplo, ao criticar a “Cartas a um francês sobre a atual crise”, de Bakunin, que surgiu na época da guerra franco-prussiana, Plekhanov deixa completamente de notar uma série de ideias interessantíssimas de Bakunin sobre a “organização a partir de baixo dos distritos agrários”, acerca da “neutralização dos (camponeses) mais astutos e mais fortes pela força coletiva da massa dos pequenos e muito pequenos camponeses”, bem como a respeito do papel do proletariado rural, que “constitui, atualmente, uma massa que sofre em silêncio e que adquire, graças ao movimento revolucionário, uma força invencível”, acerca do fato de que essa organização “permanecerá sempre aberta para a propaganda das cidades” etc. Essas ideias de Bakunin, embora imersas em confusas reflexões anarquistas referentes à destruição das instituições jurídicas oficiais, da sanção estatal, dos decretos e leis, colocam ainda assim por si mesmos uma série de problemas, ao largo dos quais nenhum revolucionário proletário deve passar. No entanto, Plekhanov quase não se detém nesses problemas, limitando-se à conclusão de que Bakunin propõe destruir o Estado “ao acaso”, na esperança de que a organização ideal se crie por conta própria.

De modo igualmente superficial, ele trata a questão da degeneração oportunista dos partidos operários em sua direção parlamentar. Em vez de mostrar em que deve consistir a tática parlamentar revolucionária e proletária e a contrapor aos ataques anarquistas contra a ação parlamentar legal em geral, Plekhanov simplesmente nega o perigo da influência corruptora do meio parlamentar sobre os deputados operários. “Basta ter”, escreve ele, “a mais superficial familiaridade com a história do partido socialista alemão para se convencer do quanto a vida prática destrói os receios dos anarquistas”.17 Lembremos que isso foi escrito três anos depois de Engels ter constatado, justamente no portátil social-democrata alemão, o perigo do oportunismo e da recaída nos trilhos da legalidade a qualquer custo.

Passando de Plekhanov para Kautsky, Lenin vai analisando toda a cadeia de evasivas, reticências e tentativas de contornar a questão do Estado que, já em 1912, tinha levado Kautsky à deturpação direta do marxismo na polêmica com o social-democrata de esquerda Pannekoek. Não escapou à atenção de Kautsky o crescimento da força do poder do Estado; sobre isso ele escreve em sua brochura “A revolução social”: “O poder do Estado”, lemos ali, “nunca tinha sido tão forte como é agora; seus recursos militares, burocráticos e econômicos nunca antes tinham alcançado tão grande desenvolvimento”. Mas a partir desse fato, Kautsky não tira a conclusão outrora extraída por Marx, a saber, que o proletariado deve concentrar todas as forças em destruir e despedaçar essa máquina. Pelo contrário, de acordo com Kautsky, “daí se conclui que o proletariado, ao conquistar o poder do Estado, adquire juntamente com ele a força que lhe dá a possibilidade de rapidamente empreender a mais radical reconstrução do edifício social”.18

Assim como na polêmica contra Bernstein, que deturpou, no espírito do mais descarado reformismo, as palavras de Marx sobre o fato de que “a classe trabalhadora não pode simplesmente tomar nas mãos a máquina estatal pronta”, também nesse caso Kautsky contornou a questão principal da destruição da máquina de Estado burguesa como condição da conquista do poder do Estado pelo proletariado.

Em 1912, na polêmica com Pannekoek, essa linha de Kautsky alcança o apogeu e se torna negação direta do marxismo. Pouco depois de proclamar, em seu livro Der Weg zur Macht (O caminho para o poder), que saiu em 1909, “a chegada da era revolucionária”, Kautsky imediatamente deu um passo para trás justamente na questão do Estado. A revolução anunciada por Kautsky, que haverá de destruir o regime capitalista, parece ao mesmo tempo não ser capaz de atentar sequer contra o mais insignificante ministério prussiano.

Qual ministério, com seus funcionários, poderia ser destruído?”, assim colocou Kautsky a questão na polêmica com Pannekoek. “Talvez o ministério da educação nacional? Ou talvez o ministério da justiça?” E ele, afinal, deu uma resposta negativa. “Devemos aspirar que a moderna justiça de classe seja destruída, mas não que a justiça seja destruída em geral. Os processos civis não se destruirão graças ao fortalecimento do proletariado, mas tampouco os crimes cessarão enquanto existir o capitalismo e enquanto ainda forem perceptíveis suas consequências”.19

Depois de 1912, muita água correu. Desde então, vimos a Revolução de Outubro, que mostrou como o proletariado pode passar sem ministérios, vimos na Alemanha a Revolução de Novembro, “encabeçada” pelos social-democratas, e que parou reverentemente na soleira das chancelarias ministeriais de Wilhelm. Pudemos observar a passagem definitiva dos social-democratas para o campo da contrarrevolução. A prática contrarrevolucionária do reformismo criou uma teoria acabada, em que o silêncio e a deturpação deram lugar a uma ruptura direta e aberta com o marxismo revolucionário. A tese de Kautsky de que o período de transição do capitalismo para o socialismo não é a ditadura do proletariado, mas a coalizão do proletariado com a burguesia: a teoria do superimperialismo, que justifica a participação na Liga das Nações, ou seja, a cumplicidade direta e sistemática dos “socialistas” com seus governos imperialistas; os lemas da conquista da assim chamada “democracia industrial”, que se resume à cooperação das organizações profissionais sindicais com os empresários – tudo isso são elementos isolados de uma doutrina nova, coerente a seu modo e inteiramente contrarrevolucionária, cuja coroação e principal sustentáculo é a luta enfurecida contra a URSS, contra o único Estado de ditadura proletária no mundo.

3 – De O Estado e a revolução até É melhor menos, mas melhor

Quatro traços fundamentais devem, na visão de Lenin, distinguir o Estado proletário, o Estado-comuna, da mais democrática república burguesa: a participação geral das massas na administração do Estado, a eletividade e amovibilidade de todos os funcionários públicos, a execução por parte deles de suas obrigações em troca de um salário médio de um operário, a substituição das instituições parlamentares por instituições “de trabalho”, ou seja, que promulgue as leis e as ponham em prática.

Lenin frisou reiteradamente que se trata aqui de um novo e mais elevado grau de democratismo, no qual “a quantidade se transforma em qualidade”. “Este grau do democratismo está ligado à saída do quadro da sociedade burguesa, ao começo da sua reorganização socialista. Se todos participam realmente da administração do Estado, então o capitalismo já não poderá manter-se” (O Estado e a revolução, p. 64).20

Por outro lado: “Quanto mais completa for a democracia, mais próximo está o momento em que se tornará desnecessária. Quanto mais democrático for o ‘Estado’ constituido pelos operários armados e que ‘já não é um Estado no sentido próprio da palavra’, mais depressa começará a extinguir-se todo o Estado” (id. Ibid., p. 96).21

Desse modo os traços indicados por Lenin proporcionam o ataque inicial na direção da reorganização socialista da sociedade, eles tiram do capitalismo a possibilidade de “manter-se” – a não participação de todos na administração perdura na mais democrática das repúblicas burguesas; por outro lado, eu seu desenvolvimento, esses mesmos traços levam ao atrofiamento do Estado, ou seja, proporcionam a etapa final da passagem do regime da ditadura proletária à sociedade comunista. É claro que diante de nós está um processo complexo e contraditório (no sentido dialético), que passa por diversas etapas e pode ser corretamente avaliado somente com o cômputo desses graus determinados de seu desenvolvimento.

Assim, por exemplo, se nos referimos à experiência de nossa Revolução, poderá parecer que tivemos a aproximação mais ideal do tipo de Estado-comunia nos primeiros anos, quando o aparato de Estado da ditadura proletária ofereceu o mínimo de deturpação burocrática pelo simples motivos de que os velhos funcionários sabotaram, ou mais propriamente, simplesmente se recusavam a trabalhar, de que em primeiro plano ainda estavam as tarefas inacabadas da quebra e da destruição da velha máquina, e a questão consistia em criar as condições sobre as quais o capitalismo não poderia se sustentar. Nessa etapa, era fácil para o Estado proletário introduzir o princípio da igualdade, extirpar inteiramente quaisquer privilégios, permitir comícios ilimitados, a mais ampla eletividade, colegialidade etc. Mas essa grande facilidade correspondia a um grau de desenvolvimento em que o poder de Estado proletário ainda não era uma ferramenta de construção econômico-socialista. Ao se elevar a esse grau mais elevado, a classe trabalhadora deveria inevitavelmente deparar-se com novas dificuldades. Essas dificuldades consistiam, sobretudo, em que era preciso “aprender a conjugar o democratismo dos comícios das massas trabalhadoras, tempestuoso, que corre como a cheia primaveril, que transpõe todas as margens, com a disciplina férrea durante o trabalho, com a obediência sem reservas à vontade de uma só pessoa, do dirigente soviético, durante o trabalho” (Lenin, XV, p. 221).22 Nesse período, Lenin precisou persistentemente esclarecer toda a importância da tarefa de promoção dos organizadores, “os homens de bom senso e com sagacidade prática, os homens que reúnam fidelidade ao socialismo com a capacidade de organizar sem barulho (e apesar da desordem e do barulho) o trabalho comum, firme e concertado de grande quantidade de pessoas no âmbito da organização soviética” (XV, p. 213).23

Em relação às medidas resolutas da luta contra a ruína do transporte ferroviário, e depois com relação à discussão geral sobre a questão da colegialidade, Lenin precisou provar que não há “absolutamente nenhuma contradição de princípio entre o democratismo soviético (isto é socialista) e a aplicação do poder ditatorial de indivíduos” (XV, p. 218).24 “Toda a grande indústria mecanizada”, frisou Lenin, “isto é, precisamente a fonte e a base material, produtiva, do socialismo exige uma unidade de vontade absoluta e rigorosíssima que dirija o trabalho comum de centenas, milhares e dezenas de milhares de pessoas […] Mas como pode ser assegurada a mais rigorosa unidade de vontade? Por meio da subordinação”, acrescentou Lenin, “ da vontade de milhares à vontade de um só” (XV. p. 218).25 “Esta subordinação”, acrescentou Lenin, “pode, com uma consciência e uma disciplina ideais dos participantes no trabalho comum, recordar mais a suave regência do maestro. Se não existir uma disciplina e uma consciência ideais, ela pode tomar forma ásperas da ditadura”.

A compreensão das formas da administração estatal soviética torna-se mais precisa nesse período. Por um lado, ela inclui um poder individual, “que os sovietes indicam e que os sovietes destituem”. Por outro lado, “esse poder firme e implacável”, até uma “ditadura de indivíduos”, é concedido “para determinados processos de trabalho (grifo de Lenin), em determinados momentos de funções puramente executivas” e, finalmente, o que é mais importante, quanto mais decididamente for concedido tal tipo de plenipotência, “tanto mais variadas terão de ser as formas e os métodos de controle a partir de baixo, para paralisar qualquer sombra de possibilidade de deturpação do Poder Soviético, para arrancar repetida e infatigavelmente a erva daninha do burocratismo” (XV, p. 224).26

Outras dificuldades, ainda maiores, estavam relacionadas com o fato de que, utilizando as palavras de Lenin, depois da época do “ataque ‘no estilo da guarda vermelha’ contra o capital” veio “a época da utilização dos especialistas burgueses pelo poder de Estado proletário para tornar a lavrar o solo de tal modo que nele não possa de modo nenhum crescer qualquer burguesia” (XV, p. 200).27

Lenin nunca escondeu que nesse caso a questão é uma concessão forçada, certo desvio em relação aos princípios: “ocultas às massas que a atração dos especialistas burgueses, por meio de salários extraordinariamente elevados, é um desvio dos princípios da Comuna, significa descer ao nível dos politiqueiros burgueses e enganar as massas. Explicar abertamente como e porque demos um passo atrás, discutir publicamente quais os meios que temos para recuperar o tempo perdido, significa educar as massas e aprender com a experiência, aprender juntamente com elas a construir o socialismo” (XV, p. 202).28

A tarefa de alcançar tais condições sob as quais não haveria lugar para o carreirismo, sob os quais os funcionários públicos não poderiam se tornar burocratas, pessoas situadas acima das massas e que gozam de privilégios, segue existindo como antes, aguardando sua resolução, mas já em outra base, mais elevada.

Pois, no presente momento, nosso Estado operário imperfeito, que admite privilégios, não somente expulsou os donos da terra e os capitalistas, como na prática está construindo o socialismo.

Naturalmente”, escreveu Lenin ainda em 1918, “os lacaios da burguesiua, em especial os de pouca monta como os mencheviques, os novojiznistas29 e os socialistas-revolucionários de direita, rir-se-ão pelo fato de termos reconhecido que demos um passo atrás. Mas não devemos prestar atenção aos seus gracejos. Devemos estudar as peculiaridades do caminho, novo e difícil no mais alto grau, para o socialismo, sem encobrir os nossos erros e fraquezas, mas tentando fazer a tempo o que não foi feito” (XV, p. 202). 30

O aumento do nível cultural das massas, a aquisição por parte delas de uma elevada disciplina do trabalho e de uma elevada técnica, a preparação de quadros próprios de especialistas tirados de dentro dos trabalhadores: eis o caminho pelo qual o Estado operário vai em direção à destruição dos privilégios e da desigualdade.

De modo idêntico se dá a questão do apelo geral às massas para a administração do Estado. O grau atingido por nós em relação a isso se revelou plenamente suficiente para que o capitalismo não pudesse sustentar-se, mas ele ainda está longe de ser suficiente da perspectiva da extinção do Estado. A República Soviética não conhece quaisquer empecilhos legislativos para a participação dos trabalhadores na administração. Mas “além da lei existe ainda o nível cultural, que não pode ser submetido a nenhuma lei. Este baixo nível cultural faz com que os sovietes, sendo pelo seu programa órgãos de administração para os trabalhadores pela camada avançada do proletariado, mas não pelas massas trabalhadoras. Aqui temos perante nós uma tarefa que só pode ser resolvida por meio de um longo trabalho de educação” (Obras completas, p. 127 – 128).31

Essa linha de pensamento de Lenin obtém sua expressão definitiva e mais desenvolvida nos artigos dedicados à reorganização do Rabkrin32 e no artigo “Sobre a nossa revolução”. Lenin põe a própria questão do aparato de Estado na perspectiva dos êxitos de da base econômica e cultural sob as premissas políticas do socialismo, conquistadas em Outubro. Zombando dos modelos mencheviques, em que estão previstas todas as formas de desenvolvimento da história mundial, Lenin não hesita em inverter a questão: “Para criar o socialismo, dizes, é necessário civilização. Muito bem. Mas então, por que não havíamos de criar primeiro no nosso país premissas da civilização como a expulsão dos latifundiários e a expulsão dos capitalistas russos, e depois, iniciar um movimento para o socialismo?” (XVIII, t. II, p. 120)33. Quais elementos existem entre nós para a edificação de um aparato de Estado verdadeiramente soviético? Somente dois, responde Lenin. Em primeiro lugar, “os operários, entusiasmados pela luta pelo socialismo. Estes elementos não são suficientemente educados. Eles desejariam dar-nos um aparato melhor. Mas eles não sabem como fazê-lo. Não podem fazê-lo. Até agora, não alcançaram o desenvolvimento, a cultura que é necessária para isso. E para isso é necessário precisamente ter cultura. Neste aspecto nada se pode fazer de repente ou de assalto, com desembaraço ou energia, ou qualquer outra das melhores qualidades humanas. Em segundo lugar, os elementos de conhecimento, de educação, instrução, que entre nós são ridiculamente reduzidos em comparação com todos os outros Estados” (XVIII, p. 126)34.

Um trabalho prolongado de educação e reeducação das massas trabalhadoras e da própria vanguarda da classe operária, com a firmeza das premissas políticas, ou seja, da ditadura do proletariado e com a consciência de que “fizemos passar o socialismo para a vida diária”: eis aí o testamento que Lenin nos deixou. Esse testamento nada mais é que a sequência do desenvolvimento e a concretização dos pensamentos que estão contidos em O Estado e a revolução.


Notas

2 “Depois de um tempo, Vladimir Ilitch conseguiu receber na cabana o caderno com seu manuscrito inacabado de O Estado e a revolução, e ali deitado de bruços ou sentado de cócoras, trabalhou nesse manuscrito” (G. Zinoviev, Lenin nas Jornadas de Julho, Proletarskaia revoliutsia, 1927, agosto-setembro, p. 69).

3 Cf. sobre a posição dos mencheviques e socialistas revolucionários na questão do significado e papel do Estado (p. 8, ed. De 1918), sobre o suborno direto ou indireto por parte dos capitalistas de tipos como Paltchinski, Tchernov, Tsereteli, Avksentiev e Skobeliev (p. 15), sobre a partilha dos cargos públicos depois da Revolução de Fevereiro (p. 30), sobre a ambição da burguesia e dos conciliadores de desarmar os trabalhadores (p. 71). Todas as páginas indicadas são da edição de 1917.

4 Coletânea Leninista, II, p. 276

5 Nota da edição brasileira: Coletânea Social-Democrata

6 Coletânea Leninista, nº 2, p. 283; nas notas a essa carta fala-se que “do artigo sendo preparado por Vladimir Ilitch, ao qual aqui ele se refere, nasceu sua obra O Estado a revolução.

7 O artigo de Bukharin, destinado à Coletânea Social-Democrata e não publicado em decorrência de divergências com a redação, foi publicado na coletânea Revolução do direito, nº 1, 1925

8 “Quando cheguei à Rússia vindo da América”, escreve Bukharin”e vi Nadiejda Konstantinovna (isso foi em nosso ilegal VI Congresso, e naquela época Vladimir Ilitch estava escondido), suas primeiras palavras foram: ‘Vladimir Ilitch pediu para que eu lhe dissesse que na questão sobre o Estado ele agora não tem mais nenhuma divergência com o Senhor’”. “Para uma teoria do Estado imperialista”, Revolução do direito, coletânea nº 1, p. 5, nota.

9Ver “Para uma teoria do Estado imperialista”, Revolução do direito, p. 30.

10 Ver a nota “A internacional da Juventude”. Obras completas, XIII, p. 461

11 Coletânea Leninista, II, p. 348

12 Ver Obras completas, XV, p. 278

13 Coletânea leninista, II, p. 349

14 Idem

15 Não consideramos desinteressante mencionar aqui a lista de obras de Marx e Engels que Lenin cita em seu livro O Estado e a revolução. De marx: A miséria da filosofia, O manifesto comunista (assim como seu último prefácio assinado por Marx e Engels, de 24/06/1872), O 18 Brumário, A guerra civil na França, “Carta a Kugelman de 12/04/1871”, um artigo contra os antiautoritários italianos, datado de 1873 e publicado em 1913 no Neue Zeit com o título de “O indiferentismo político”, Crítica ao programa de Gotha. Engels: A origem da família etc., Anti-Duhring, Sobre a questão da moradia, “Prefácio à terceira edição do 18 Brumário”, “Carta a bebel de 18-28 de março de 1875”, “Crítica do programa de Erfurt”, publicada no Neue Zeit, 1901-2, t. I, “Prefácio à terceira edição de A guerra civil na França”, coletânea de artigos Internationales aus dem Volksstaat, prefácio de 3/01/1894, artigo extraído da coletânea italiana do ano de 1873 reimpressa na Neue Zeit de 1913 com o título de “Sobre o princípio da autoridade”.

16 Neue-Zeit, 1901-02, I, S. 11.

17 G. Plekhanov, Anarquismo e socialismo, tradução do alemão de N. Nina, p. 54

18 A revolução social, edição russa, p. 32

19Neue Zeit, 1912, II, p. 725.

20Nota da edição brasileira: Ed. port.: O Estado e a revolução. In LÉNINE, V.I. Obras escolhidas em três tomos, t. 2, Moscou/Lisboa: Progresso/”Avante!”, 1981, o. 290

21 Nota da edição brasileira: Ed. port.: ibid., p. 291

22 Nota da edição brasileira: Ed. port.: As tarefas imediatas do poder soviético. In LÉNINE, V.I., op. Cit., p. 583

23 Nota da edição brasileira: Ed. port.; ibid., p. 577

24 Nota da edição brasileira: Ed. port.; ibid., p. 581

25 Nota da edição brasileira: Ed. port.; ibid., p. 581

26 Nota da edição brasileira: Ed. port.; ibid., p. 585-586

27 Nota da edição brasileira: Ed. port.; ibid., p. 565-566

28 Nota da edição brasileira: Ed. port.; ibid., p. 567

29 Nota da edição brasileira: Articulistas do jornal menchevique Novaia Jizn

30 Nota da edição brasileira: Ed. port.; ibid., p. 567

31 Nota da edição brasileira: Ed. port.: VIII Congresso do PCB (b). In LÉNINE, V. I. Obras escolhidas em três tomos, t. 3, Moscou/Lisboa: Progresso/”Avante!”, 1980, p. 104

32 Nota da edição brasileira: Acrônimo de Rabotche-krestianskaia inspektsia, Inspeção operário-camponesa, órgão existente entre 1920 e 1934 para supervisionar o funcionamento da administração soviética.

33 Nota da edição brasileira: Sobre a nossa revolução. In LÉNINE, V.I., op. Cit. p. 665.

34 Nota da edição brasileira: Ed. port.: É melhor menos, mas melhor. In LÉNINE, V. I., op. Cit., p. 671.

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