Por Guilherme Giotti Sichelero
A Grande Fome irlandesa de 1845-1849 foi um evento de suma importância para a formação da Irlanda moderna, assim como das classes trabalhadoras da Inglaterra e Estados Unidos. A fome que atingiu a ilha não foi somente uma recorrente crise de subsistência – tão comum em economias e sociedades pré-capitalistas -, mas, ao contrário, foi engendrada pela colonização inglesa e, além disso, foi parte essencial do processo de industrialização capitalista inglês. Nesse sentido, esse artigo busca defender a tese de que a causa estrutural da fome irlandesa pode ser encontrada no modelo colonial aplicado pela Inglaterra, que possuía três pilares principais: a transformação da economia irlandesa em exportadora de matérias-primas e alimentos, a existência de um mercado de terras via arrendamentos e a solidificação de uma economia interna de subsistência baseada na produção da batata.
Há um famoso ditado popular mexicano, atribuído ao ditador Porfirio Díaz, que sintetiza, de modo genial, a relação do país latino-americano com o seu vizinho do norte: “Pobre México, tan lejos de Dios y tan cerca de Estados Unidos”. Essa relação entre, de um lado, uma potência capitalista industrial e, do outro lado, os seus vizinhos empobrecidos e atrasados não foi nenhuma novidade do imperialismo norteamericano. A Inglaterra, muito antes, já havia posto os povos das Ilhas Britânicas para trabalhar em favor do seu próprio desenvolvimento capitalista, cabendo a maior parte do ônus desse processo para a rural, agrária e camponesa Irlanda. Nesse sentido, dentro desse contexto, uma das principais consequências do modelo colonial inglês aplicado na ilha foi a Grande Fome de 1845-1849 – segundo Eric Hobsbawm a “maior catástrofe humana da história europeia”[1] ocorrida durante a primeira metade do século XIX (1789-1848).
O modelo colonial inglês aplicado na Irlanda possuía três pilares principais: a) a transformação da economia irlandesa em exportadora de commodities (sobretudo grãos) para abastecer o mercado interno inglês, isto é, nesse sentido, produzir alimentos para uma crescente população urbana e matérias-primas para a emergente indústria inglesa – além da exportação de uma força de trabalho barata e numerosa; b) a existência de um mercado de terras (via arrendamentos) e o parcelamento da propriedade agrária; c) uma economia camponesa de subsistência voltada à produção da batata como alimento principal de consumo da maioria da população irlandesa – a economia da batata.
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A revolução industrial inglesa teve como principal consequência para a Irlanda um reforçamento da ruralização[2] e a especialização na exportação de commodities, assim como a desurbanização e o declínio da produção manufatureira interna[3] (que possuía um importante e tradicional setor têxtil), ou seja, enquanto a Inglaterra se industrializava, a Irlanda passava por um processo de “desindustrialização”[4], que ocorria em favor do desenvolvimento econômico inglês. Evidentemente que o estabelecimento de uma economia primário-exportadora, como observam Marx e Engels, atendia aos interesses da burguesia industrial inglesa (mais interessados na mão de obra barata e numerosa) e sobretudo de uma parte dos landlords (grandes latifundiários ingleses) que possuíam terras na Irlanda. Nesse sentido, as Leis dos Cereais (Corn Laws) de 1815, que buscavam restringir a importação de grãos, uma importante vitória política dos landlords[5], significou para a Irlanda quase que uma situação de monopólio na exportação de cereais para a Inglaterra[6] – embora a maior parte dos lucros desse intercâmbio fossem para os próprios latifundiários ingleses.
Na reestruturação da divisão internacional do trabalho que ocorreu com o advento da revolução industrial, a Irlanda posicionou-se como uma economia subalterna: exportadora de alimentos, matérias-primas e trabalhadores e importadora de produtos industriais. Assim, de um lado, enquanto, ao mesmo tempo, a Irlanda teve um papel fundamental no desenvolvimento industrial inglês (não somente por ter sido o celeiro da Inglaterra, mas sobretudo devido à exportação de mão de obra barata[7]), em outras termos, na acumulação capitalista inglesa, de outro lado, ocorria o seu processo de desacumulação de capitais e perpetuação do seu subdesenvolvimento e periferização ou, como prefiro, do atraso econômico. Esse era, afinal, o sentido da colonização inglesa[8]. Segundo Engels:
A Inglaterra havia de tornar-se a ‘oficina do mundo’; todos os outros países haviam de tornar-se para a Inglaterra aquilo que a Irlanda já era: mercados para os seus bens manufacturados, fornecendo-lhe em troca matérias-primas e alimentos. A Inglaterra, o grande centro manufactureiro de um mundo agrícola, com um número sempre crescente de Irlandas cerealíferas e algodoeiras girando à volta dela, o Sol industrial[9]
Uma peculiaridade do modelo colonial inglês em relação à outras formas de colonização reside no fato de que havia um mercado de terras e o predomínio do parcelamento rural. Os landlords possuíam a propriedade das terras e as alugavam à arrendatários irlandeses que, por sua vez, subarrendavam para arrendatários ainda menores que faziam o mesmo[10], assim o parcelamento da terra e o predomínio de pequeníssimos lotes (cerca de menos de 5 acres) eram a norma do regime agrário. Como consequência, a concorrência entre esses pequenos arrendatários fazia com que os preços das rendas fossem muito altos[11], diminuindo, assim, o investimento em cultivos agrários e rebaixando o padrão de vida dos irlandeses.
Mas por trás desse regime agrário e do aumento populacional – ocorrido desde o início do século XIX –, estava o desenvolvimento de uma economia de subsistência voltada à produção da batata (a economia da batata)[12]. A batata havia sido introduzida na Irlanda em 1586, mas somente no final do século XVIII havia se generalizado na economia irlandesa. O cultivo da batata era relativamente simples, requeria pouca força de trabalho e bastava uma pequena superfície para produzir uma boa quantidade, além disso o seu consumo diário, aliado ao leite, era o suficiente para manter um estado de saúde tolerável[13].
Os ingleses haviam imposto aos irlandeses o abandono dos antigos métodos e cultivos tradicionais e a utilização de métodos modernos de cultivo agrário baseado na fertilização através do guano peruano – que aumentaram a produtividade, embora enfraquecessem imunologicamente as batatas[14]. Além disso, a produção da batata era favorável aos interesses dos ingleses na medida que “não exauria o solo e ainda permitia que uma grande porcentagem da terra fosse voltada para o plantio de grãos que seriam exportados para a Inglaterra”[15]. Nesse sentido, a unidade produtiva camponesa padrão (pequenos lotes) era dividida em dois setores principais: um setor destinado à subsistência, com predomínio ou totalidade do cultivo da batata, e outro setor destinado à produção de commodities para a Inglaterra. A adoção da batata e a maior produtividade agrária teve como consequência o aumento demográfico (em 1791, um pouco mais de 4 milhões; em 1821, entorno de 7 milhões; em 1845, mais de 8 milhões[16]) que, por sua vez, estimulava os landlords a concederem mais arrendamentos cada vez menores, visando os lucros de exportação e das rendas.
A consequência do modelo colonial inglês na Irlanda (economia primário-exportadora, mercado de terras e economia da batata) era a perpetuação e o reforçamento do atraso econômico e o pauperismo camponês generalizado[17]. Em 1845, a batata havia se tornado o único alimento sólido de 4 entre 10 habitantes da ilha, e cerca de 1/3 de toda a população apenas consumia batata[18]. Nesse contexto, “as más colheitas e as doenças das plantações na metade da década de 1840 forneceram apenas o pelotão de fuzilamento para um povo já condenado”[19]!
A Grande Fome irlandesa de 1845-1849 foi, antes de mais nada, uma crise de subprodução alimentícia, algo que era crônico no país, ocorrendo constantemente desde o século XVIII[20], isto é, a fome era sistêmica na Irlanda. Sendo assim, a fome da década de 1840 foi apenas a intensificação de um fenômeno recorrente na história da Irlanda colonizada, embora dessa vez tenha atingido o país em sua totalidade e com um “custo humano” muito maior. A causa imediata, além das más colheitas de 1845 e anos subsequentes, foi o fungo phytophthora infestans – que havia surgido na América do Norte e se espalhado na Europa continental[21] –, responsável pelo apodrecimento precoce das batatas, mais fracas imunologicamente e com baixa variação genética[22]. Em 1845, talvez se tenha plantado cerca de 2,1 milhões acres de batata, do qual cerca de metade ou ¾ foram destruídos pelo fungo[23].
Por outro lado, a principal causa da catástrofe foi a colonização inglesa[24] que, além de explorar a população a partir da dinâmica das rendas e da exportação de commodities e material humano, forçava a economia irlandesa à monocultura – tanto internamente (economia da batata), quanto externamente (economia primário-exportadora) –, além disso atuava contra o desenvolvimento econômico do país na medida que acabava com qualquer alternativa industrial da Irlanda, inclusive destruindo com a sua tradicional produção têxtil. A lógica do sistema colonial se atesta se levarmos em consideração que durante quase todo o período da Grande Fome a exportação de alimentos para a Inglaterra permaneceu, com preços em média de 100.000 libras esterlinas mensais[25]. A colonização inglesa foi, pelo menos nesse período, a verdadeira responsável pelo pauperismo irlandês!
As consequências da Grande Fome de 1845-1849 foram de suma importância para a posterior história irlandesa. Em primeiro lugar, a população da ilha, que em 1845 era maior que 8 milhões, diminuiu para cerca de 6 milhões. Tradicionalmente, a partir de fontes “grosseiras”, se há afirmando que 1 milhão de pessoas morreu diretamente como decorrência da fome (doenças e desnutrição), enquanto outro milhão emigrou para outros países, majoritariamente de tradição anglófona – somando, assim, um descenso de dois milhões de pessoas. Esses dados são muito questionáveis e se baseiam sobretudo nos censos de 1841 (que indicava uma população de 8,2 milhões) e 1851 (que indicava entorno de 6,5 milhões), em contrapartida o “custo humano” e, como consequência, os prejuízos para o desenvolvimento econômico-social são irrefutáveis – a população persistira diminuindo e só voltaria a crescer novamente em meados do século XX, nunca mais atingindo 8 milhões.
Em relação à emigração, muitos irlandeses – essa força de trabalho fundamental para a industrialização inglesa – se dirigiram à tradicional emigração para Inglaterra (cerca de 750 mil, entre 1845-1855[26]), contudo outros irlandeses preferiram principalmente os demais países de tradição anglófona: entre 1841-1850 (sem contar a Grã-Bretanha), 70% emigrou para os Estados Unidos, 27.9% para o Canadá, 1.8% para a Australásia (sobretudo Austrália e Nova Zelândia); na década seguinte, 1851-60, 81% para os EUA, 9.7% para o Canadá, 8.3% para a Australásia. A emigração para os EUA foi significativa: entre 1841-1850, 908,292 irlandeses; 1851-60, 989,880; 1861–70, 690,845; 1871–80, 449,549; 1881–90, 626,604; 1891–1900, 427,301. Enquanto que, na década de 1841-1850, o Canadá atingiu o seu ápice com 362,738 emigrantes e a Australásia, na década 1851-1860, com 101,541[27]. Assim como na Inglaterra, nos Estados Unidos os irlandeses desempenharam um papel fundamental na emergente indústria norte-americana: serviram como mão de obra não-qualificada, ao mesmo tempo que rebaixavam os salários e competiam com os trabalhadores negros[28]. Pode-se dizer, sem exageros, que pauperismo irlandês foi um dos pilares fundamentais do desenvolvimento econômico inglês e norte-americano.
Uma das principais consequências da Grande Fome, que possui relações com a própria história da Inglaterra, foi a revogação das Leis dos Cereais, em 1846[29]. A revolução burguesa na Inglaterra, ocorrido em meados do século XVII, havia estabelecido a dominação conjunta de classe dos landlords junto à emergente burguesia inglesa[30] – primeiro, dos setores mercantis, mais tarde, dos setores manufatureiros-industriais. Com o advento da revolução industrial e da sociedade burguesa, a burguesia dominava cada vez mais a sociedade, e a preponderância política dos landlords ia enfraquecendo. Nesse contexto, as Leis dos Cereais de 1815 significaram uma importante vitória política para aristocracia rural, na medida que lhe dava uma parte dos lucros do gigantesco desenvolvimento econômico inglês, decorrente da transformação industrial. Contudo, durante o século XIX, o enfraquecimento dos landlords era notório: a reforma eleitoral de 1832 foi um dos aspectos mais sintomáticos desse processo.
A burguesia industrial buscava impor completamente uma política econômica livre-cambista, mas dentro se seu próprio país havia um grande empecilho: as Leis dos Cereais. Nesse sentido, essa legislação protecionista que já era muito criticada pelos setores burgueses, ganhou uma forte oposição durante a crise agrícola de 1845-46, já que a imposição da economia primário-exportadora havia levado a Irlanda a uma catástrofe alimentícia. Evidentemente que a burguesia industrial inglesa não pretendia, em nenhum sentido, acabar com a fome na Irlanda[31] – visto que lhe beneficiava em relação à mão de obra irlandesa –, mas sim acabar com o monopólio dos landlords na produção de commodities, já que eram praticamente obrigados a comprar os grãos encarecidos da Irlanda e Grã-Bretanha, e, com isso, tinham seus lucros diminuídos – tanto por pagarem maiores salários, quanto pela compra das matérias-primas. Assim, a revogação das Leis dos Cereais, em 1846, significou a vitória da burguesia industrial inglesa e da sua política livre-cambista e a derrota dos landlords, dos setores burgueses ligados à especulação e do protecionismo[32].
Para a Irlanda, as consequências do fim do monopólio das commodities também foram importantes. Num primeiro momento, a perda do mercado inglês fez com que aqueles camponeses que ainda não haviam caído totalmente no pauperismo ficassem impossibilitados de pagar as rendas, assim sendo expulsos de seus arrendamentos. A fome irlandesa que havia acelerado o processo de revogação do Corn Laws, dialeticamente, foi intensificada pelo fim do monopólio irlandês. A consequência estrutural para a economia irlandesa foi o fim da economia da batata e uma mudança de direcionamento na economia primário-exportadora, cada vez mais especializada na bovinocultura, ovinocultura[33] e exportação de aveia. Com o descenso populacional e com as mudanças produtivas (os novos cultivos eram menos produtivos e requeriam mais força de trabalho que a batata), o parcelamento da terra diminuiu e ocorreu o processo de concentração dos arrendamentos e propriedades rurais[34].
O estado inglês, de fato, buscou apaziguar o problema da fome a partir do assistencialismo público (a ampliação da Lei dos Pobres, Irish Poor Laws, para a Irlanda já havia ocorrido em 1838) e de um programa de obras públicas, principalmente de construção de estradas. Embora a Irlanda tenha se beneficiado mais tarde da infraestrutura criada nesse período, não houve imediatamente um avanço econômico e o ônus decaiu totalmente sobre os empobrecidos camponeses, que eram obrigados a pagarem impostos maiores. Além disso, os salários pagos aos trabalhadores eram extremamente baixos, inclusive abaixo do gasto calórico necessário para esse tipo de atividade. Em 1847, essas obras contavam com cerca de 735 mil operários e havia cerca de dois mil comitês de assistência pública pelo país[35].
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A Grande Fome foi a consequência da imposição à Irlanda, pela colonização inglesa, de uma economia voltada para o mercado externo e, ao mesmo tempo, dependente internamente da monocultura da batata. A Irlanda, que como vimos, desempenhou um importante papel na acumulação de capitais inglesa, não passou despercebida por Marx e Engels. Em várias de suas obras[36], os fundadores do materialismo histórico dedicaram-se a estudar tanto o papel subalterno da economia irlandesa, quanto à importância, supracitada nesse trabalho, da força de trabalho dos irlandeses no desenvolvimento industrial inglês. Ademais, os acontecimentos na Irlanda também fizeram parte da desenfreada luta de classes entre a burguesia liberal e os landlords e a consequente vitória, como afirmou Marx, do partido do livre comércio inglês.
Notas
[1] HOBSBAWM, E. A Era das Revoluções 1789–1848. São Paulo: Paz e Terra, 2015 [1962]. p. 170.
[2] SPECK, W. A. História Concisa da Grã-Bretanha. São Paulo: EDIPRO, 2013. p 67.
[3] “Sob Guilherme III, chegou ao poder uma classe que tinha como único objetivo o lucro, e a indústria irlandesa foi suprimida com o objetivo de forçar a Irlanda a vender suas matérias-primas para a Inglaterra a qualquer preço […] A União deu o tiro de misericórdia nas possibilidades de renascimento da indústria irlandesa […] toda vez que a Irlanda estava prestes a desenvolver sua indústria, ela foi esmagada e reconvertida em uma terra meramente agrícola” In: MARX, K. Proyecto de una conferencia sobre el problema irlandés. Dictada el 16 de diciembre de 1867 en la asociación cultural de trabajadores alemanes en Londres [1867]. In: MARX, K.; ENGELS, F. Imperio y colonia. Escritos sobre Irlanda. Ciudad de México: Siglo XXI Editores, 1979. p. 154-170.
[4] “Exceto no nordeste (Ulster), o país tinha de há muito sido desindustrializado pela política mercantilista do governo britânico colonialista e, mais tarde, pela competição da indústria britânica” In: HOBSBAWN, 1962, op. cit., p. 170. O termo “desindustrialização” deve ser usado com cuidado nesse caso, já que na Irlanda o que existia era a produção manufatureira e artesanal e não, de fato, uma indústria moderna com a utilização do maquinário movido a carvão.
[5] ENGELS, F. Prefácio à Edição Inglesa de 1892 de «A Condição da Classe Operária em Inglaterra». Marxist.org, 1892. In: https://www.marxists.org/portugues/marx/1892/01/11.htm.
[6] MARX, 1867, op. cit., p. 164.
[7] “O rápido desenvolvimento da indústria britânica não teria sido possível se a Inglaterra não dispusesse de uma reserva – a numerosa e pobre população da Irlanda” In: ENGELS, F. A situação da classe trabalhadora na Inglaterra. São Paulo: Boitempo, 2010 [1845]. p. 131.
[8] Ver: PAULA, P. G. Marx e a formação da periferia do mercado mundial capitalista: o caso irlandês. Esquerda Online, 06 de agosto de 2015. In: https://esquerdaonline.com.br/2015/08/06/marx-e-a-formacao-da-periferia-do-mercado-mundial-capitalista-o-caso-irlandes/#_edn3.
[9] ENGELS, 1892, op. cit., s/p.
[10] ENGELS, 1845, op. cit., p. 304; MARX, 1867, op. cit., p. 163; HOBSBAWM, 1962, op. cit., p. 170; SPECK, 2013, op. cit., p. 68.
[11] “Os aluguéis aos proprietários no início da década de 1840 representavam algo na ordem de 25-30 por cento da produção agrícola” In: BIELENBERG, A. The Irish Economy, 1815–1880. In: KELLY, J (org.). The Cambridge History of Ireland. Cambridge: Cambridge University Press, 2018. Volume 3: 1730–1880. p. 316.
[12] Marx, em 1861, escreveu: “O que a batata foi para a agricultura irlandesa, o algodão é para o ramo dominante da indústria da Grã-Bretanha” In: MARX, K. From The Crisis in England. Marxist.org, 1861. In: https://www.marxists.org/archive/marx/works/1861/11/06.htm.
[13] RANELAGH, J. O. Historia de Irlanda. Madrid: Ediciones Akal, 2014. p. 162.; STATE, P. A Brief History of Ireland. New York: Facts On File, 2008. p. 184-185.
[14] GUIMARÃES, E. A. M. Agricultura industrial, commodities, cacau, mandioca e batatas. In: Scientiarum Historia IX, 2016, Rio de Janeiro. Livro de Anais do Scientiarum Historia IX. Rio de Janeiro: UFRJ, 2016.; MANN, C. C. 1493: uncovering the new world Columbus created. New York: Alfred A. Knoff, 2011.
[15] “O povo irlandês conseguia cultivar grandes quantias de batatas nutritivas com as quais alimentavam suas famílias e seus animais. Já os latifundiários ingleses se beneficiavam do fato de que o plantio de batatas não exauria o solo e ainda permitia que uma grande porcentagem da terra fosse voltada para o plantio de grãos que seriam exportados para a Inglaterra” In: THORNTON, M. O que causou a grande fome da Irlanda?. Mises Brasil, 2014 [1998]. In: https://www.mises.org.br/Article.aspx?id=1925.
[16] Ver: GURRIN, B. Population and Emigration, 1730–1845. In: KELLY, J (org.). The Cambridge History of Ireland. Cambridge: Cambridge University Press, 2018. Volume 3: 1730–1880.
[17] Eric Hobsbawm enxergou a causa estrutural da Grande Fome na contradição entre o aumento populacional (consequência direta da economia da batata) e o atraso econômico: “Uma simples inovação técnica — a substituição pela batata dos tipos anteriormente prevalecentes de agricultura — tornara possível um grande aumento da população, pois um acre de terra plantado com batatas pode alimentar muito mais gente do que um acre dedicado a pasto ou outros tipos de cultura. A demanda dos proprietários de terra por um número máximo de rendeiros que lhes proporcionassem dividendos e também, mais tarde, por uma força de trabalho para cultivar as novas fazendas que exportavam alimentos para o crescente mercado britânico encorajou a multiplicação de minúsculas propriedades. […] durante o século XVIII e princípios do século XIX, a população se multiplicou nestas faixas de terra, vivendo à base de 10-12 libras peso de batata por dia para cada pessoa e — pelo menos até a década de 1820 — à base de leite e de um pedaço ocasional de peixe; uma população cuja pobreza não tinha paralelo na Europa Ocidental. Visto que não havia emprego alternativo — pois a industrialização estava excluída — o resultado dessa evolução era matematicamente previsível. Quando a população tivesse crescido até os limites do último pedacinho de terra plantado de batatas haveria uma catástrofe” In: HOBSBAWM, 1962, op. cit., p. 170.
[18] MANN, 2011, op. cit., p. 302.; RANELAGH, 2014, op. cit. p. 162.
[19] HOBSBAWM, 1962, op. cit., p. 170.
[20] “A fome já havia atingido a Irlanda muitas vezes. Em 1740-1741, estima-se que 400.000 a 500.000 morreram por causa da praga da batata (uma taxa quase tão alta quanto em 1845-1849). Durante o século XIX, antes de 1845, houve fomes em 1807, 1817, 1821-1822, 1830-1834, 1836 e 1839. No entanto, embora sempre tenha sido acompanhada de morte e emigração, a perda da safra de batata e a fome sempre foi localizado” In: RANELAGH, 2014, op. cit., p. 163. “A Irlanda conheceu falhas de batata (Potato Failure) antes – houve 14 pragas parciais ou completas de 1816 a 1842 e várias no século XVIII, notadamente o Bliain an áir (o ano do abate) em 1740-41” In: STATE, 2008, op. cit., p. 185. “Escassez de alimentos atribuível ao fracasso da safra de batata ocorreu em 1817, 1822, 1831,1835-7, 1839 e 1842, com muito pior para vir entre 1845 e 1849, quando a fome se alastrou por vários anos com consequências devastadoras” In: BIELENBERG, 2018, op. cit., p. 337.
[21] STATE, 2008, op. cit., p. 185.
[22] Ver: A Monocultura e a Grande Fome Irlandesa da Batata: Casos de falta de variação genética. USP, s/d. In: https://evosite.ib.usp.br/relevance/IIAmonoculture.shtml.
[23] MANN, 2011, op. cit., p. 301-302.
[24] Mesmo um economista liberal, ligado à escola austríaca, salienta a importância da colonização inglesa na Grande Fome irlandesa: “A Irlanda foi devassada pelas forças econômicas originadas por um dos mais poderosos e agressivos estados que o mundo já conheceu. Sua população sofreu não por causa de um fungo (cujos cientistas ingleses insistiam ser apenas umidade excessiva), mas sim por causa da colonização, da espoliação, da servidão, do protecionismo, dos preços artificialmente altos sustentados pelo governo, do assistencialismo estatal e de insensatos programas de obras públicas” In: THORNTON, 1998, op. cit., s/p.
[25] RANELAGH, 2014, op. cit. p. 168.
[26] RANELAGH, 2014, op. cit. p. 171.
[27] KENNY, K. Irish Emigration, 1845–1900. In: KELLY, J (org.). The Cambridge History of Ireland. Cambridge: Cambridge University Press, 2018. Volume 3: 1730–1880. p. 1062-1063.
[28] “O papel dos imigrantes irlandeses, que desenvolveram rapidamente um novo monopólio sobre a mão-de-bra não-qualificada na indústria da construção e do emprego fabril, nesse período, em renhida competição com os negros americanos, revelou-se especialmente importante nesse aspecto” In: WOLF, E. A Europa e os Povos sem História. São Paulo: Editora da USP, 2005 [1982]. p. 435.
[29] MARX, 1867, op. cit., p. 165; NÉRÉ, J. A Inglaterra das grandes reformas (1815-1867). In: IDEM. História Contemporânea. DIFEL: São Paulo, 1981. p. 126.; SPECK, 2013, op. cit., p. 72-73.; MARX, 1861, op. cit., s/p.
[30] Ver: MARX, K.; ENGELS, F. Revolução do século XVII na Inglaterra: “Por que a Revolução na Inglaterra teve sucesso?”: uma crítica do panfleto de Guizot. Marxist.org, 1850. In: https://www.marxists.org/portugues/marx/1850/02/inglaterra.htm.
[31] Engels foi bem “objetivo” ao classificar a atuação dessa classe social: “desconheço uma classe tão profundamente imoral, tão incuravelmente corrupta, tão incapaz de avançar para além do seu medular egoísmo como a burguesia inglesa – e penso aqui na burguesia propriamente dita, em particular a liberal, empenhada na revogação das leis sobre os cereais. Para ela, o mundo (inclusive ela mesma) só existe em função do dinheiro; sua vida se reduz a conseguir dinheiro; a única felicidade de que desfruta é ganhar dinheiro rapidamente e o único sofrimento que pode experimentar é perdê-lo” In: ENGELS, 1845, op. cit., p. 307.
[32] “A revogação das Corn Laws foi uma vitória do capitalista manufactureiro, não apenas sobre a aristocracia fundiária, mas também sobre aquelas secções de capitalistas cujos interesses estavam mais ou menos ligados com o interesse fundiário — banqueiros, especuladores com acções [stock-jobbers], detentores de fundos [fund-holders], etc. Livre-Câmbio significava o reajustamente de toda a política interna e externa, comercial e financeira, da Inglaterra em consonância com os interesses dos capitalistas manufactureiros — a classe que agora representava a nação” In: ENGELS, 1892, op. cit., s/p.
[33] “Entre 1855 e 1866: 996,877 cabeças de gado (bovino, ovino e suíno) substituíram a 1,032,694 de irlandeses” In: MARX, 1867, op. cit., p. 169. Os dados quantitativos utilizados por Marx são questionáveis (baseados em relatórios oficiais da época), mas a interpretação é correta.
[34] RANELAGH, 2014, op. cit., p. 171.; MARX, 1867, op. cit., p. 165-169.
[35] THORNTON, 1998, op. cit., s/p.; RANELAGH, 2014, op. cit. p. 168.; STATE, 2008, op. cit., p. 183-185.
[36] Ver: MARX, K.; ENGELS, F. Imperio y colonia. Escritos sobre Irlanda. Ciudad de México: Siglo XXI Editores, 1979.
Sobre o autor
Guilherme Giotti Sichelero é licenciado em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e especialista em Ciências Humanas e Sociais pela Universidade Federal do Piauí (UFPI).