O Computador e o Mercado

Por Oskar Lange, via Cibcom, traduzido por Jéssica Vianna

Não faz 30 anos que publiquei um “ensaio sobre a teoria econômica do socialismo”. Pareto e Barone demonstraram que as condições do equilíbrio econômico em uma economia socialista podiam expressar-se por um sistema de equações simultâneas. Os preços que resultam dessas equações proporcionam uma base para o cálculo econômico racional no socialismo (naquela época se considerou somente o aspecto do equilíbrio estático. Em uma data posterior, Hayeck e Robbins sustentaram que as equações Pareto-Barone não tinham aplicações práticas e que a solução de um sistema de milhares de equações simultâneas era impossível e, consequentemente, o problema prático de cálculo econômico no socialismo permaneceu insolucionável. Em meu ensaio refutei o argumento Hayeck- Robbins demonstrando como um mecanismo de mercado que pode estabelecer-se em uma economia socialista levaria à solução das equações simultâneas por meio de um procedimento empírico de tentativa e erro.


Partindo de um conjunto arbitrário de preços o preço se eleva sempre e quando a demanda exceda a oferta e baixa em caso oposto. Através de um processo de pontuação, descrito primeiro por Walras, se alcançam gradualmente os preços de equilíbrio final são estes precisamente, os que satisfazem o sistema de equações simultâneas. Se assumiu, sem dúvida alguma, que o processo de pontos de fato converge ao sistema de preços de equilíbrio.

Se reescrevesse este ensaio agora, minha tarefa seria muito mais simples. Minha pergunta a Hayeck e Robbins seria: Qual é o problema? Ponhamos as equações simultâneas em um computador eletrônico e obteremos a solução em menos de um segundo. O processo de mercado com suas pontuações complicadas se torna antiquado e assim, pode ser considerado como uma ferramenta de cálculo da idade pré-eletrônica.

O mecanismo do mercado e o procedimento de tentativa e erro proposto no meu trabalho, realmente desempenhou o papel de um método de cálculo para resolver um sistema de equações simultâneas. A solução se encontrou por um processo iterativo que se supôs convergente. As iterações se basearam no princípio de retroalimentação que opera para eliminar gradualmente os desvios de equilíbrio. Se enfatizou que o processo operaria como um servomecanismo  qual, através da ação de Retroalimentação, automaticamente elimina os desvios.

O mesmo processo pode utilizar-se para uma máquina eletrônica analógica que simule o processo de iteração que está implícito nas apalpações do mecanismo de mercado. Um computador analógico (servomecanismo) simula o funcionamento do mercado. Este postulado, no entanto, pode inverter-se: o mercado simula o computador eletrônico analógico. Em outras palavras, o mercado pode ser considerado como um computador sui generis que serve para resolver um sistema de equações simultâneas, este opera como uma máquina analógica: um servomecanismo baseado no princípio da retroalimentação. O mercado pode considerar-se como um dos métodos históricos mais antigos para a solução de equações simultâneas. A questão de interesse é que o mecanismo de solução não opera por uma via física, e sim através de um processo social. Assim acontece que os processos sociais podem servir como base para a operação de sistemas de retroalimentação que levam à solução de equações por iteração.

Hoje em dia, os diretores das economias socialistas tem dois instrumentos de cálculo económico. Um é o computador eletrônico (Digital ou analógico) , e o outro é o mercado. Nos países capitalistas, também o computador eletrônico se usa com certa extensão como instrumento de cálculo econômico. A experiência mostra que para um número muito grande de problemas de aproximação linear é suficiente, daqui que se haja divulgado amplamente o uso das técnicas de programação linear. Em uma economia socialista tais técnicas têm um campo ainda mais amplo de aplicação, pois podem aplicar se a economia nacional como um todo.

Pode ser interessante comparar os méritos relativos do mercado e do computador em uma economia socialista. O computador tem a vantagem inegável de sua grande velocidade, tanto que o mercado é um servomecanismo desagradável e lento. Seus processos de iteração operam com consideráveis períodos de atraso e oscilações e podem não convergir jamais. Isto se mostra pelos ciclos da web, os inventários e outros ciclos de reinvestimento, assim como nos ciclos gerais dos negócios. Por isso os leilões walrasianos estão cheios de flutuações irritantes e podem levar também a divergências. A este respeito o computador eletrônico mostra uma superioridade indesafiável. Trabalham com uma velocidade enorme, não produzem flutuações no processo econômico real e a convergência de suas iterações se assegura na própria construção.

Outra desvantagem do mercado como um servomecanismo é que suas iterações causam efeitos na renda. Qualquer mudança nos preços provoca perdas e ganhos a vários setores da população, o quê por sua vez cria problemas à direção de uma economia socialista. Além disto, pode provocar movimentos conservadores de resistência ao processo de iteração que implica o uso do mercado como servomecanismo. Tudo isto, porém, não significa que o mercado não tenha méritos relativos. Antes de mais nada, ainda os computadores eletrônicos mais poderosos têm uma capacidade limitada. Podem existir (e existem) Processos econômicos tão complexos que em termos do número de mercadorias e do tipo de equações, que nenhum computador pode abranger elas, ou melhor, pode ser custoso demais construir computadores De capacidade tão grande. Em tais casos não resta senão o uso do antiquado servomecanismo do mercado que tem uma capacidade de trabalho muito mais ampla.

Em segundo lugar, o mercado está incorporado institucionalmente na economia socialista atual. Em todos os países socialistas (Com exceção de certos períodos em que se usou o racionamento) os bens de consumo se distribuem à população por meio do mercado. Aqui, o mercado é uma instituição social existente e é inútil aplicar uma ferramenta de cálculo alternativa. O computador eletrônico pode ser aplicado para fins de prognóstico, mas o prognóstico calculado tem que validar-se mais tarde pelo funcionamento real do mercado.

Uma limitação importante do mercado é que trata o problema do cálculo somente em termos estatísticos, ou seja, como um problema de equilíbrio. Não provê um funcionamento suficiente para a solução de problemas de crescimento e desenvolvimento. Em particular não proporciona uma base adequada para a planificação econômica a longo prazo. Para a planificação econômica de desenvolvimento, os investimentos a longo prazo tem que considerar-se fora do mecanismo do mercado e basear-se no juízo da política econômica de desenvolvimento. Isto se deve a que os preços presentes reflitam dados atuais, Enquanto que o investimento muda os dados pela criação de novos investimentos, novas condições técnicas de produção, e frequentemente também, pela criação de novas necessidades ( A criação da indústria e da televisão cria a demanda de televisões e não de outro tipo de bens). Em outras palavras, o investimento muda as condições de oferta e demanda que determinam os preços de equilíbrio. Isso acontece tanto para o capitalismo como para o socialismo.

Pelas razões indicadas, a planificação do desenvolvimento a longo prazo, como regra, está baseada em um conjunto de considerações de política econômica mais que sobre cálculos baseados nos preços correntes. Porém, a teoria prática da programação matemática (Linear e não linear) torna possível introduzir cálculo econômico rigoroso neste processo. Definir uma função objetiva (Por exemplo, maximizar o aumento de renda nacional por um período) e certas restrições, os preço-sombra futuros, podem ser calculados. Estes preço-sombra servem como um instrumento de cálculo econômico nos planos de desenvolvimento a longo prazo. Os preços de equilíbrio do mercado real não bastam aqui, e isso faz necessário o conhecimento dos futuros preço-sombra programados.

A programação matemática se converte em um instrumento essencial para a planificação econômica Ideal a longo prazo. Como isto implica a solução de um grande número de equações e inequações,  o computador eletrônico é indispensável.  A programação matemática,  ajudada por computadores eletrônicos,  se converte no instrumento fundamental da planificação econômica a longo prazo,  tanto como para a solução dos problemas da dinâmica econômica de campo mais limitado.  Aqui o computador eletrônico não substitui o mercado,  ele preenche uma função que o mercado nunca foi capaz de executar.

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