Por Isabelle Graw e Samo Tomšič, via Texte zur Kunst, traduzido por Felipe Campos
A busca aparentemente insaciável por prazer e gozo é parte essencial do que nos move como seres humanos. Esse fato é explorado pelos sistemas do capital moderno em todo o mundo, onde o prazer está estruturalmente ligado ao trabalho que fazemos e à gratificação que ele supostamente nos proporciona. Mas o prazer e o gozo são também pontos centrais de partida na prática da psicanálise. Então, onde os dois se cruzam—a psicanálise e as formas modernas de trabalho? Esse cruzamento é a base de O Trabalho do Gozo, o livro mais recente do filósofo esloveno, e morador de Berlim, Samo Tomšič. Recentemente, Isabelle Graw, cofundadora e editora da revista Texte zur Kunst, reuniu-se com Samo Tomšič para discutir as implicações de seus recentes estudos para o campo da arte.
Isabelle Graw: Seu livro O Trabalho do Gozo: Para uma crítica da economia Libidinal (2019) argumenta basicamente que a produção do gozo é uma forma de trabalho essencial para o sistema capitalista. Combinando conceitos marxianos e freudianos de forma original, você descreve o capitalismo como uma economia “libidinal”, onde o gozo desempenha um papel crucial, ainda que problemático. Fiquei realmente impressionada com a sua demonstração das múltiplas ligações entre exploração e gozo. Mas também fiquei me perguntando como de fato trabalhamos para o sistema enquanto estamos gozando? Há alguns exemplos no seu livro, e me pergunto se você estava pensando nas redes sociais, por exemplo – no fato de o prazer que sentimos ao publicar selfies literalmente poder ser explorado ali? Também me perguntei como você integraria na sua teoria aquelas pessoas que detestam o seu trabalho – aquelas que trabalham em empregos precários no setor de serviços, como os entregadores, por exemplo. Uma certa hostilidade contra o próprio trabalho pode ser observada até entre artistas, embora obviamente seu trabalho seja muito mais autodeterminado do que o trabalho, digamos, de um trabalhador assalariado. Eu me pergunto, no entanto, se é realmente verdade que todos os empregos são “baseados no gozo”, como argumentado no livro. O senhor não estaria ignorando todos esses trabalhos que não são nada aprazíveis? Também me perguntei sobre o papel que os artistas poderiam desempenhar nesta “economia do gozo” que você descreve de forma tão convincente. É certo que se espera que os artistas produzam “gozo excedente”, mas eles também têm de sublimar num regime que eu caracterizaria como “sublimação imposta”. Embora na sua teoria a sublimação pareça ser a saída – ela funciona como contraponto à repressão – pode-se também argumentar que a sublimação é produtiva e produtora de valor, pelo menos no setor artístico. Por último, gostaria de saber mais e em mais detalhe sobre a forma como a linguagem aparece. Você descreve a linguagem como uma “fábrica de gozo”, mas revela como os sujeitos se tornam alienados através da linguagem e do trabalho. Como falar, então? É possível usar a linguagem para além do gozo? Isso seria mesmo desejável?
Samo Tomšič: A contribuição lacaniana para a crítica do capitalismo baseia-se no ponto de que, estruturalmente falando, o gozo assume a mesma posição que a mais-valia. Lacan observou certa vez que a maior revolução do capitalismo na esfera subjetiva consistia em tornar o gozo contável, calculável. A mais-valia poderia, portanto, ser descrita como gozo exteriorizado, extraído de nossos pensamentos, corpos e ações e convertido em valor. Empresas como o Instagram ou o Facebook demonstram mais explicitamente essa quantificação do gozo, uma vez que o seu negócio consiste em obter lucro a partir da nossa publicação compulsiva. A psicanálise também permite o reconhecimento de uma intuição interessante do Capital de Marx, onde o capitalista é descrito como personificação social da pulsão universal de autovalorização. Segundo Marx, vivemos num sistema compulsivo em que a produção de mais-valia e a correspondente obsessão por um eterno crescimento econômico sugerem uma força autônoma do sistema. Em Freud, o prazer também está ligado a uma atividade mental compulsiva, e aqui devo lembrar que o uso que ele faz do termo Lust se aproxima de “luxúria” em português, um afeto carnal que o sujeito nem sempre experimenta como prazeroso. Além disso, o gozo não conhece “medida certa”; ele transita entre o excesso e a falta. O exemplo mais óbvio seria o consumismo. Marx já afirmava que as mercadorias não são produzidas para satisfazer as necessidades humanas, mas para as produzir. Assim, as mercadorias causam insatisfação e não satisfação.
Se eu agora associar isso ao seu exemplo das pessoas que odeiam o seu trabalho, diria que esse ódio aponta para a mesma compulsão problemática. Sob o capitalismo neoliberal, nos vemos obrigados a sentir prazer com o trabalho e, portanto, a gozar com essa compulsão central em nossas vidas e com todo o sistema de exploração construído sobre ela. Essa é a base da ideia neoliberal do eu-empreendedor: a exploração é internalizada; já não vem de fora, mas torna-se a mais primordial das nossas maneiras de nos relacionarmos tanto com nós mesmos quanto com os outros, a nossa moralidade interior. Isso me leva à pergunta: O que os artistas têm em comum, por exemplo, com os pesquisadores das ciências humanas? Eles não realizam nenhum trabalho socialmente produtivo aos olhos do público, apenas procrastinam, parasitariamente, com financiamento público. É claro que a hipocrisia de tal “crítica” ignora a situação real do mercado da arte ou do mercado acadêmico, que poderia ser chamada de “lumpenproletarização”, no sentido de que artistas e pesquisadores estão sujeitos a severa precarização e (auto)exploração sob condições que dificilmente comportam tentativas de organização política. É apenas natural que essas pessoas odeiem o seu trabalho, mas isso não as impede de continuar no mercado na esperança de um eventual sucesso. Essa é uma característica fundamental da moralidade capitalista: eu renuncio ao gozo, isto é, tolero uma vida de miséria no presente para obter lucro no futuro. Mas esse futuro é sobretudo uma miragem. Neste ponto, uma forma negativa de sublimação poderia entrar em cena, por isso concordo contigo que a sublimação pode ser algo imposto, no sentido de que impõe a renúncia ao gozo que mencionei. Talvez se possa até dizer que vivemos o tempo da sublimação imposta, tal como, no auge da sociedade de consumo, as pessoas viviam nos tempos da “dessublimação repressiva” (Marcuse) e do “gozo imposto” (Lacan).
Por último, gostaria de responder às suas observações sobre a linguagem. Do ponto de vista da psicanálise, seria um equívoco acreditar que a linguagem e o gozo podem ser separados. Certas escolas filosóficas tentaram, em particular as da tradição do positivismo lógico e da filosofia analítica, mas sempre falharam, uma vez que separar a linguagem do gozo implicaria essencialmente separá-la do corpo vivo. Não existe uma linguagem ideal nesse sentido. Na política, pudemos observar tentativas igualmente ingênuas, o que nos leva à metamorfose da linguagem política na chamada guinada populista. Antes de figuras como Trump e outros ocuparem o debate público, nossos políticos “democráticos” eram treinados para falar uma linguagem estéril, quase artificial, o que lhes permitia não dizer nada enquanto criavam a aparência de dizer algo. Os políticos eram treinados a, durante suas falas, controlar ou disfarçar qualquer sinal de afeto, excitação, irritação, etc. Com a figura do populista temos o paradigma do gozo discursivo. Trump é o exemplo mais extremo dessa novidade, uma vez que a sua linguagem parece estar em permanente estado de dissolução gramatical, além de ter um vocabulário extremamente pobre. Mesmo assim, ela é repleta de gozo, violência e obscenidade. E isso comove as massas. O perigo do populismo contemporâneo está ligado ao fato de estar muito consciente deste fato, e essas forças da direita exploram esse poder da linguagem com muito mais habilidade do que as da esquerda.
IG: Se entendi direito, há dois extremos quando se trata do complexo linguagem/gozo: de um lado, está a linguagem estéril e sem sentido que os políticos costumavam usar, do outro, está a perigosa linguagem populista, “repleta de gozo, violência e obscenidade”, que atualmente parece estar atingindo com sucesso um público amplo. Como seria uma terceira maneira de associar a linguagem ao gozo, talvez no contexto da psicanálise? Faço este pedido por outra forma de linguagem/gozo aqui no interesse dos muitos críticos de arte (inclusive eu) que estão atualmente bastante insatisfeitos com a linguagem (muitas vezes desprovida de gozo) que utilizam. Na sua representação de uma economia libidinal, a culpa é da pulsão implacável, com a sua interminável produção de excedente. Como forma de lidar com essa pulsão indomável, você propõe (com Freud) que ela seja “domada” (gebändigt), desviada ou reorientada. Imediatamente me perguntei o que isso significaria para artistas e produtores culturais como nós – a pulsão não funciona como o sistema operacional da produção artística por excelência? Talvez essa seja a razão pela qual muitos artistas tendem a evitar a psicanálise a todo custo: porque temem que sua pulsão criativa seja domesticada. Embora certamente concorde com a sua insistência na dimensão estrutural do sofrimento pessoal, também me pergunto se a psicanálise consegue realmente compreender os sintomas individuais como sendo de natureza social. Talvez você possa elaborar como isso está acontecendo efetivamente no tratamento psicanalítico, que tem uma orientação bastante individualista, pelo menos na minha experiência. Você também descreveu a psicanálise como uma oportunidade de desestabilizar a identidade. Na verdade, você parece celebrar a psicanálise por sua “política não identitária”. Embora concorde com a sua noção de uma identidade alienada per se, me pergunto, no entanto, se todas as identidades podem realmente suportar essa “política não identitária” que você parece defender. Porque se alguém se vê marcado por uma identidade que implica em discriminação, pode ser forçado a assumir essa identidade ao insistir que ela deve contar como as outras. É claro que isso tem de acompanhar o reconhecimento de que o poder é normalmente exercido e a discriminação experimentada de formas múltiplas e contraditórias simultaneamente, o que se reflete numa compreensão interseccional da política identitária. Você é contra esse tipo de política identitária? Ou como você descreveria uma política não identitária? Como seria uma “política comunista não identitária” na realidade?
ST: Penso que a questão de inventar uma linguagem que evite tanto a armadilha do purismo como a da obscenidade está intimamente ligada ao seu segundo ponto sobre a forma como a arte permite distorcer a relação entre pulsão e trabalho. Esse assunto está em questão na sublimação, através da qual a arte – mas também a ciência, o ativismo político, a filosofia, etc. – potencialmente permite que os indivíduos transformem a sua internalização nos meandros de uma economia libidinal de repressão, por exemplo. O problema com muitas abordagens psicanalíticas da arte, particularmente a de Freud, é que elas não evitam totalmente sua psicologização. Ainda assim, Freud e Lacan reconheceram que a arte poderia desempenhar a mesma função que a análise, tornando-a redundante, o que não significa que os artistas ocupem uma posição privilegiada. É tudo uma questão de qual trabalho acontece na produção artística. Também nunca ousaria afirmar que todos deveriam fazer análise. A análise não é um imperativo e sempre fui contra a sua fetichização, inclusive quando analistas argumentam que quem não fez análise não pode falar ou escrever sobre a psicanálise de forma eficaz. Isso é transformar a psicanálise em algo esotérico. No entanto, vejo na psicanálise mais do que uma prática clínica restrita ao indivíduo, ou pior ainda, uma “terapia de classe”. Um caso clínico nunca é pura singularidade, mas também não é algo universalmente válido. Ele se situa numa zona cinzenta onde a singularidade da própria história se enreda nas exigências insuportáveis da cultura, como diria Freud. A pulsão opera nessa zona cinzenta, e se olharmos para o trabalho de Freud e Lacan, não podemos ignorar que eles não glorificam a pulsão. A pulsão é uma força problemática. Ela espelha o fato de os indivíduos não controlarem suas próprias vidas, de suas vidas serem desapropriadas por dentro, por assim dizer. Assim, a pulsão envolve sempre luta e trabalho, e presumo que a arte possa ser um campo para essa luta, o que não significa dizer que ela automática e necessariamente seja.
Falando agora de política identitária, devo enfatizar que não critico as lutas contra a discriminação e a exploração das quais a política identitária surgiu historicamente, mas sim a domesticação liberal da sua luta por um universalismo político emancipatório. Portanto, o meu problema é a apropriação liberal da política identitária e sua transformação em lutas particularizadas. A política identitária radical parte do nó raça, gênero e classe, atravessando assim a crítica do capitalismo e da discriminação econômica, a crítica da economia libidinal e da discriminação sexual, e a crítica do racismo e da discriminação étnica. Com Lacan, eu diria que raça, gênero e classe formam um nó borromeano da política emancipatória, o que significa que, se um elemento é removido, tudo se dissolve. Esse nó representa um denominador comum anticapitalista entre versões particulares de políticas identitárias. Mas foi também isso que a apropriação liberal da política identitária dissolveu com mais ou menos êxito, transformando-o num instrumento de divisão política. Em outras palavras, a remoção de um dos elementos do nó contribui, em última análise, para a predominância da branquitude, da heteronormatividade e da masculinidade. Enquanto raça, gênero e classe estiverem unidos, eles formam um continuum, apesar das diferentes lutas em que possam ter se envolvido historicamente. E sabemos muito bem que a ideologia liberal e neoliberal nos tem reeducado há décadas para pensar “além da classe” ou para abandonar a questão de classe aos excessivamente ideológicos e, portanto, artificiais.
Ora, dizer que a psicanálise se concentra na instabilidade das identidades, no entrelaçamento entre identidade e não identidade, significa que ela trata a identidade como um processo, como algo que resulta da história, muitas vezes de uma história traumática, no centro da qual se encontra a ligação entre alienação e exploração. A apropriação capitalista da política identitária, por sua vez, renova a fantasia de uma subjetividade estável e fechada que parece derivada de uma compreensão superficial da identidade. Ela traça linhas divisórias nítidas e intransponíveis entre diferentes subjetividades e, assim, impede sua organização em um horizonte político comum. Aquilo que canhestramente chamo de “política comunista não identitária” representa uma política que enfatiza as diferenças ou aquilo que não é identitário, não como algo que se coloca entre as identidades e, portanto, enseja a separação das subjetividades, mas como algo que está inscrito na identidade e, portanto, representa um “comum subjetivo” negativo, algo que liga e organiza a subjetividade política numa luta unificada contra a devastação capitalista, sem, no entanto, negar as diferenças nas histórias de identidades particulares. Repito, isso não significa uma rejeição da política identitária, mas a reafirmação do seu caráter anticapitalista, que pode ser observado em todas as lutas históricas contra a discriminação.
IG: Sua opinião sobre a política identitária está muito mais clara para mim agora. Ao mesmo tempo que você abomina a apropriação liberal dela, que pode transformar uma noção interseccional de identidades instáveis no oposto disso, você na verdade defende uma identidade entendida como não identitarismo, porque esse não identitarismo permitiria uma luta contra o capitalismo que não nega diferenças ou posições sociais específicas. Parece-me que estamos encontrando uma forte resistência neste momento (não só entre a masculinidade de direita, mas também à esquerda) contra essa noção psicanalítica de identidade em processo, instável. O reconhecimento dessa identidade instável parece assustar todo o espectro político. Por falar em resistência, gostei muito dos paralelos entre psicanálise e crítica traçados no seu livro: você afirma que ambos encontram um tipo de resistência semelhante. Isso é verdade sobretudo para a psicanálise, que, a meu ver, atualmente está sendo rejeitada por sua suposta ineficiência e, assim, vem sendo substituída cada vez mais pela cultura do coaching. A crítica, por outro lado, vem sendo atacada há algum tempo. Ora se afirma que ela é discriminatória e, portanto, deve ser abolida, e ora se alega que ela é inerentemente supérflua, uma vez que foi substituída por avaliações online. Você também aponta para as sobreposições conceituais entre a psicanálise e a crítica no seu livro. Você afirma que tanto Marx quanto Freud visam a uma “política da elaboração “, e tanto o processo de análise quanto o processo de crítica “mobilizam e organizam essa subjetividade sintomática (vida danificada, subjetividade explorada) em um sujeito potencialmente revolucionário”. Poderia explicar em mais detalhes não só como a crítica de Marx à economia política, mas também a psicanálise de Freud, visam à transformação da vida danificada num sujeito revolucionário? E, finalmente, como esse sujeito se distinguiria de um sujeito não revolucionário?
ST: A democracia liberal e o populismo contemporâneo tratam a identidade como o último refúgio de estabilidade da subjetividade. Claro, uma diferença importante é que o liberalismo combina isso com uma segregação econômica abstrata, enquanto o populismo resgata abertamente as formas mais vulgares de sexismo, racismo e nacionalismo. Ainda assim, tanto o liberalismo como o populismo representam uma “perversão” da política identitária. Na psicanálise e na crítica da economia política, bem como em certas correntes do feminismo, anticolonialismo, movimentos LGBTQ+, etc., vemos tentativas de questionar identidades estáveis, normativas e normalizadas e, além disso, de des-limitar (entgrenzen) a subjetividade, mostrando justamente que não existe uma norma estável que a fundamente. O liberalismo sempre foi hipócrita à medida que apoia o pluralismo mas continua a reproduzir a normatividade na figura da branquitude, da heterossexualidade e da masculinidade. Não consigo deixar de lembrar o trocadilho de Lacan, normal – norme mâle, que denuncia a “normalidade” como “norma masculina”.
Você falou de elaboração , que é acima de tudo um processo social, mesmo quando se realiza no contexto clínico psicanalítico. Freud não deixa dúvidas de que na elaboração não há uma posição externa, que estaria livre de resistência à cura e, portanto, de resistência à mudança. Portanto, os analistas não devem se esquecer de que eles mesmos não são exceções. A elaboração visa a transformar as relações, estruturas e instituições simbólicas (linguísticas, econômicas, epistêmicas e outras) que sustentam a condição social e determinam nosso lugar como sujeitos. Dando um salto para as políticas emancipatórias radicais, diria que uma subjetividade revolucionária não pode nem deve ser atribuída exclusivamente a um grupo social, minoria ou classe, se não caímos no risco de fetichização. Aqui vemos novamente por que a domesticação liberal da política identitária a transforma em algo que se conforma às demandas do sistema capitalista. Ela afirma a diferença não como algo que desestabiliza a identidade por dentro, mas como um limite que separa identidades supostamente diferentes, entre as quais não há qualquer “subjetividade comum”, nenhuma unidade política adequada, nem solidariedade, enfim, nenhum “ismo” que se possa derivar desse “comum”. Entendo a “crítica” como uma tentativa de pensar uma subjetividade sem limites, porque apenas essa des-limitação (Entgrenzung) pode estabelecer uma aliança entre diferenças que suscite um potencial de transformação (ou seja, uma aliança entre identidades diferentes e diferentes histórias que alicerçam essas identidades, etc.).
No que diz respeito à “crítica”, lembro da chacota de Marx da “crítica crítica” em A Ideologia Alemã. “Crítica crítica” – ou seja, a crítica autocentrada e autossuficiente – é a que predomina na mídia e na política, e também nas artes e nas humanidades, então não é de se surpreender que a “crítica” em seu sentido radical, sinônimo de pensamento transformador, termine confundida com uma critiquice superficial qualquer. Ler Marx imediatamente nos mostra que o trabalho da crítica consiste numa tentativa de estabelecer um novo jeito de pensar e de agir no mundo, contra a resistência organizada do sistema capitalista.