Por Sandra Bloodworth, via Marxist Left Review, traduzido por Gabriela S.
“Uma das concepções mais absurdas advindas do Iluminismo do século XVIII é a de que, no início da sociedade, a mulher teria sido escrava do homem.”
– Frederick Engels, A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado.(1)(2)“Um princípio fundamental da análise marxista é que […] não há mãos ou princípios invisíveis guiando a evolução humana. Essa análise também vê a mudança como produzida por forças internas ao próprio sistema social. Ou seja, as causas não são externas e independentes da organização social. O inevitável crescimento populacional, as condições ecológicas ou a vontade de Deus não são justificavas para guerra, pobreza, machismo ou qualquer outra questão social.”
– Karen Sacks, Sisters and Wives. The past and future of sexual equality.(3)
O livro de Frederick Engels, A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado (doravante A Origem), foi publicado em 1884. Em seu texto, Engels argumenta que os primeiros seres humanos viveram em sociedades não hierárquicas nas quais as mulheres não eram oprimidas. A ideia de que as classes podiam deixar de existir e que os homens nem sempre dominaram as mulheres foi ampla e sistematicamente denunciada como absurda na academia das ciências sociais. E o livro até hoje continua sendo objeto de debate, especialmente entre as feministas.
A argumentação de Engels apresenta alguns pontos fracos, e não apenas por o autor ter que confiar nos estudos, agora superados, de sua geração, mas também porque, apesar de ser um dos defensores mais progressistas dos direitos das mulheres da época, Engels aceita muitos dos estereótipos sobre a sexualidade feminina reproduzidos em seu tempo. No entanto, há um amplo reconhecimento da importância deste livro. Gerda Lerner, uma teórica feminista que não é famosa por seu apoio ao marxismo, diz que, apesar de suas evidentes fraquezas,
“Engels teve uma enorme contribuição para nossa compreensão da posição da mulher na sociedade e na história […] Ao situar “a derrota do sexo feminino no plano da história mundial” no período de formação dos estados arcaicos, com base no domínio das elites proprietárias, ele deu historicidade ao evento. Embora não tenha conseguido provar nenhuma de suas proposições, ele estabeleceu as principais questões teóricas dos próximos cem anos.” (4)
Engels resumiu as anotações feitas por ele e Marx sobre a pesquisa do antropólogo americano Lewis Henry Morgan. Também incorporou a pesquisa sobre a história da família nas sociedades antigas feita por Johann Bachofen, historiador e arqueólogo suíço, e baseou-se em sua própria pesquisa sobre as sociedades germânicas e celtas. Este livro não foi um trabalho individual e secreto. A obra só pode ser totalmente compreendida se tomada em conjunto com as ideias desenvolvidas por Engels e Marx em A Ideologia Alemã, Teses sobre Feuerbach, O Manifesto Comunista e O Capital, citando apenas os mais conhecidos. Seus esforços conjuntos para entender a sociedade capitalista e toda a sua degradação e opressão envolveram, desde seus primeiros escritos, lidar com a questão da opressão das mulheres. Nos livros Sobre a Questão Judaica, escrito quando Marx tinha 25 anos, Manuscritos Econômicos e Filosóficos, de 1844, e A Sagrada Família, publicado mais tarde naquele ano, Marx frequentemente se refere à escravidão das mulheres e a necessidade de sua emancipação(5). Engels, em sua primeira grande obra, A Situação da Classe Trabalhadora na Inglaterra, escrita de 1844 a início de 1845, trata repetidamente das perigosas e debilitantes condições as quais trabalhadoras eram submetidas. O autor discute os efeitos sobre mulheres e homens do fato de as mulheres trabalharem enquanto os homens ficam em casa desempregados e argumenta contra a moralização dos comentaristas liberais. Se isso não parece natural, argumenta Engels, deve ser porque há “algum erro radical na relação original entre homens e mulheres. Se o domínio da esposa sobre o marido […] não é natural, então o domínio anterior do marido sobre a esposa também não deve ter sido natural”. (6)
Além disso, o artigo de Engels O Papel do Trabalho na Transformação do Macaco em Homem, em grande parte negligenciado pelos críticos de A Origem, estabeleceu uma base sólida para a compreensão do desenvolvimento humano. Fundamentado na teoria da evolução de Darwin, mas teoricamente embasado em suas conclusões materialistas e nas de Marx, Engels argumentou que foi o uso das mãos, possibilitado pela postura ereta, que direcionou o desenvolvimento humano ao caminho da fabricação de ferramentas. Isso resultou em uma inteligência crescente e no desenvolvimento da fala. Depois de uma série de controvérsias e até mesmo de evidências fraudulentas no século seguinte, a descoberta na África, em 1974, de um esqueleto de três milhões e meio de anos com um cérebro do tamanho de um macaco, mas com uma postura ereta, fez com que a proposta de Engels fosse amplamente aceita, embora nem sempre fosse explicitamente atribuída a ele.
O objetivo deste artigo é analisar se a proposição básica de Engels – de que a opressão das mulheres coincidiu com a divisão da sociedade em classes e o surgimento do Estado – se sustenta. Não tratarei de cada erro ou debilidade, pois muitos deles são periféricos a essa questão. E não vou responder a todos os argumentos feitos por seus críticos, pois a maioria deles também não são relevantes para este ponto, e eu já respondi alguns deles em outros momentos.(7)
Primeiro, com base no estudo antropológico e arqueológico reunido ao longo do último meio século, debaterei alguns dos argumentos mais frequentes que afirmam que a opressão das mulheres é universal. Em seguida, descreverei o argumento básico de Engels. Em terceiro, traçarei meu argumento, que se baseia fortemente no marxista britânico Chris Harman, que interpretou pesquisas mais recentes utilizando o método teórico de Engels.(8) Finalmente, mostrarei que a evidência arqueológica mais recente, embora desafie radicalmente os detalhes históricos de Engels, na verdade fortalece sua tese central de que a opressão das mulheres foi estabelecida como sociedade dividida em classes. No entanto, vou além de Engels e Harman para explicar as origens da opressão das mulheres, de uma maneira que considero mais consistente com o marxismo.
A opressão das mulheres é universal?
Até a década de 1960, os antropólogos concordavam quase unanimemente que as mulheres sempre foram oprimidas. A antropologia, devido à sua posição enquanto pesquisa científica, era difícil de ser desafiada. Portanto, as feministas que assumiram essa posição foram fundamentais. Simone de Beauvoir escreveu em seu famoso livro O Segundo Sexo, que “este sempre foi um mundo de homens” e que “a mulher […] [é] a presa da espécie”(9). O argumento de Susan Brownmiller de que os homens sempre foram violentos com as mulheres foi muito influente entre as feministas na década de 1970 (10). Em oposição ao marxismo, a autora atribuiu outras divisões sociais, como classe e raça, à dominação masculina das mulheres: “Os conceitos de hierarquia, escravidão e propriedade privada derivavam e só podiam ser fundamentados na subjugação inicial da mulher”.
Brownmiller atingiu um ponto sensível em feministas que aceitam conjecturas de psicologia do senso comum no lugar de evidências históricas, desde que tratem os homens como o principal inimigo:
“uma das primeiras formas de vínculo masculino deve ter sido o estupro coletivo de uma mulher por um bando de homens saqueadores. Isso realizado, o estupro tornou-se não apenas uma prerrogativa masculina, mas a arma básica de força do homem contra as mulheres, o principal agente de sua vontade e seu medo. […] Por imposição anatômica – a construção inevitável de seus órgãos genitais – o macho humano era um predador natural.”
Foi o “medo de uma temporada aberta de estupros” que levou as mulheres a fazerem a “barganha arriscada” do “relacionamento conjugal” e foi o “único fator causador da subjugação original da mulher pelo homem”. (11)
A antropóloga Margaret Mead descobriu que “os Arapesh [não] têm nenhuma concepção sobre a natureza masculina que torne o estupro compreensível para eles”. Isso indica claramente que o estupro é um produto de sistemas sociais específicos, e não apenas dos atributos fisiológicos dos homens. Mas Brownmiller não faz nenhuma tentativa de explicar como isso pode ser entendido em vista de suas próprias afirmações generalizadas. (12)
Desde então, tem surgido uma riqueza de estudos antropológicos e arqueológicos que fornecem evidências esmagadoras de que as mulheres nem sempre foram oprimidas e, portanto, nem sempre sofreram violência masculina. E, no entanto, a maioria dos escritores não marxistas e até mesmo alguns que afirmam concordar com Marx (embora não com Engels), como Heather Brown – autora do mais recente estudo sério sobre o livro de Engels e os Cadernos Etnológicos de Marx – ainda relutam em aceitar essa proposição básica.(13)
Algumas feministas estudaram primatas não humanos, extrapolando o que observaram para construir uma imagem da evolução humana e como as primeiras sociedades poderiam ter sido. Elas concluíram que não havia evidências de que os primeiros hominídeos, que evoluíram dos macacos, teriam sido dominados por homens com mulheres submetidas à violência. A própria Brownmiller cita Jane Goodall, que estudou chimpanzés selvagens e descobriu que a fêmea não cruzava com todos os machos que se aproximavam dela. Nem mesmo os machos mais persistentes tinham fama de estupradores. A autora chega a citar o livro Man and Monkey, de Leonard Williams, que concluiu que “na sociedade dos macacos não existe estupro, prostituição ou mesmo consentimento passivo”, (14) no entanto, Brownmiller afirma que, como as fêmeas humanas são sexualmente ativas a qualquer momento, ao contrário de outros primatas, os homens são capazes de estuprar. O que fica implícito é que macacos e chimpanzés são fisicamente incapazes de estuprar, mas a estudiosa feminista Sally Slocum descobriu que os primatas não humanos “parecem não tentar o coito (quando a fêmea não é receptiva), independentemente da capacidade fisiológica” (15). Um estudo posterior, baseado em observações semelhantes, além de estudos arqueológicos e antropológicos, concluiu que no alvorecer da humanidade “o cenário era de mães bípedes, que usavam ferramentas, compartilhavam alimentos e eram sociáveis, e que escolhiam copular com machos que também possuíam esses traços”(16).
Há muitas lacunas em nosso conhecimento entre esses primeiros passos na evolução dos hominídeos a partir dos macacos, provavelmente há mais de dois milhões de anos, e o surgimento das sociedades de classe. Acredita-se que o Homo sapiens tenha surgido a partir do Homo erectus há cerca de 200.000 anos e, por quase 190.000 anos, viveu em comunidades igualitárias com culturas cada vez mais sofisticadas e complexas, nas quais não havia opressão.
O ponto de partida para avaliar as evidências antropológicas sobre essas sociedades de caçadores-coletores é reconhecer o viés contido nos dados. Acadêmicos e antropólogos que coletaram essas informações acompanharam invasores coloniais e fanáticos cristãos. Eles eram, invariavelmente, culturalmente cegos e preconceituosos em relação a outras sociedades, de modo que suas conclusões não podem ser lidas pelo seu valor nominal. Em sua esmagadora maioria homens, levaram consigo os valores culturais e sociais da sociedade capitalista que distorceram a interpretação do que viram, especialmente no que se refere às relações de gênero. Antropólogas como Eleanor Burke Leacock, Karen Sacks e outras demonstraram convincentemente a natureza masculina e preconceituosa dos argumentos de antropólogos influentes como Malinowsky e Lévi-Strauss.xvii Como concluí em um estudo dos diários dos primeiros “exploradores” no oeste da Austrália:
“as relações de gênero na sociedade aborígine tradicional eram entendidas em grande parte nos termos estabelecidos pelo preconceito e pelas expectativas europeias da época. O ideal de mulheres ociosas e a justaposição de “malditas prostitutas e policiais de Deus” foram bordados e entrelaçados com o racismo e o sexismo brutais que caracterizaram a ocupação branca”. (18)
Antropólogos ocidentais e outros observadores, impondo sua visão de mundo sobre as sociedades que estudaram, assumiram a família nuclear do capitalismo moderno como uma característica universal da organização humana da reprodução e da sexualidade. Pensava-se que a sociedade estava dividida na esfera “pública”, masculina, e na esfera “privada”, feminina, um conceito claramente associado historicamente à ascensão do capitalismo e completamente inútil na compreensão da natureza igualitária, cooperativa e integrada da vida dos caçadores-coletores. Como a responsabilidade das mulheres pelo cuidado das crianças em nossa sociedade contribui para sua opressão, assumiu-se erroneamente que isso poderia ser interpretado como o significado de seu trabalho em todas as sociedades (19). Até mesmo muitas antropólogas feministas “conferem uma posição inferior à maternidade, que elas consideram uma restrição às atividades, um obstáculo ao desenvolvimento da personalidade e uma redução do valor simbólico das mulheres. Elas projetam os valores da nossa cultura em outras culturas” (20). Judith Brown, escrevendo sobre a suposta divisão do trabalho por gênero na sociedade dos caçadores-coletores, escreve que as tarefas das mulheres “são relativamente monótonas e não exigem concentração extasiada; e o trabalho não é perigoso, pode ser realizado apesar de interrupções (por crianças)” (21). Isso, ela supõe, significa que as mulheres ocupavam uma posição inferior. Mostrarei abaixo que essa visão, que já estava sendo contestada, é ainda menos defensável à luz dos estudos mais recentes.
Em segundo lugar, o eurocentrismo da maior parte da antropologia obscurece os efeitos da expansão colonial nas sociedades pré-capitalistas. Como a antropóloga feminista Rayna Reiter observou:
“Não podemos interpretar literalmente a vida dos povos forrageiros existentes – como os bosquímanos !Kung do Kalahari, os esquimós, os aborígenes australianos – como exibições e réplicas de processos que especulamos terem ocorrido no Paleolítico. Tampouco podemos assumir que os povos dizimados, marginalizados e que foram empurrados para os limites de seu ambiente por milhares de anos de invasão, exibirão características originais” (22).
A expansão colonial trouxe mudanças profundas. Essas mudanças podem ser rápidas, afetando a pesquisa feita mesmo em um período muito precoce de invasão. Por um lado, os membros da sociedade que estava sendo colonizada logo aprenderam estratégias de sobrevivência e de minimização de ataques contra si mesmos (23). Acredita-se amplamente que as mulheres indígenas na Austrália eram tratadas como bens móveis de classe inferior antes da invasão branca. Os argumentos baseiam-se em relatos que refletem os preconceitos dos primeiros colonos e ignoram os efeitos catastróficos da invasão branca. A maioria dos relatos dos primeiros contatos se refere aos “nativos” como se os homens fossem os únicos de alguma importância; por exemplo, “vimos os nativos e suas mulheres”. Os exploradores esperavam lidar com homens e viam as mulheres como objetos sexuais, se é que eram notadas. Os aborígenes muito cedo conheceram o sequestro e estupro de mulheres. Henry Reynolds relata que os habitantes das Ilhas do Estreito de Torres contaram a um funcionário do governo em 1881 que, quando os homens brancos eram avistados, as mulheres eram enterradas na areia para evitar maus-tratos (24). Onde esse era o caso, o preconceito masculino dos exploradores e de outros observadores era ainda mais exagerado. A impressão que eles tinham das relações de gênero na sociedade aborígine era a de que os homens eram o sexo dominante e extrovertido e as mulheres eram retraídas, submissas e medrosas. Isso então teve uma dinâmica que reforçou o exagero da importância dos homens. Os exploradores do sexo masculino deram presentes aos homens. Esses presentes, como machadinhas, facas, farinha, açúcar e tabaco, podem parecer triviais se considerados individualmente. No entanto, à medida que o contato aumentava e os produtos dos invasores se tornavam cada vez mais cobiçados e difundidos entre os aborígenes, era de se esperar que esses presentes mudassem o equilíbrio das relações entre homens e mulheres. Por exemplo, quando a terra se tornava menos acessível ou produtiva por causa da invasão, os aborígenes dependiam mais da comida dos homens brancos. Isso reduziu a capacidade das mulheres de prover o próprio sustento e o de seus filhos independentemente dos homens. (25)
Leacock documentou as pressões exercidas sobre as relações sociais igualitárias pelos jesuítas e outros comprometidos com as relações sociais hierárquicas e a opressão das mulheres, à medida que colonizavam as terras dos Montagnais-Naskapi do Canadá e dos índios iroqueses da América do Norte (26). Ela resumiu:
“a estrutura da sociedade igualitária tem sido mal compreendida como resultado do não reconhecimento da participação das mulheres nessa sociedade como pública e autônoma. Conceituar os bandos de caçadores/coletores como grupos soltos de famílias nucleares, nas quais as mulheres estão ligadas por relações diádicas de dependência a homens individuais, projeta nos caçadores/coletores as dimensões de nossa própria estrutura social. Tal conceito implica uma visão teleológica e unilateral da evolução social, pela qual nossa sociedade é vista como a expressão plena das relações que estiveram presentes em toda a sociedade […] Reinterpretações do papel das mulheres nas sociedades de caçadores/coletores revelam que relações qualitativamente diferentes foram obtidas.” (27)
Algumas das evidências mais recentes e convincentes de que as mulheres não foram universalmente oprimidas estão no sítio neolítico de Çatalhöyük, na Anatólia, que foi continuamente ocupado por 1.400 anos até 6.000 a.C. Novas interpretações de evidências arqueológicas e avanços na ciência em testes de DNA desafiaram as conclusões originais sobre este fascinante local. A equipe que trabalha com Ian Hodder, arqueólogo chefe do local desde 1994, “buscou arduamente” as diferenças nas dietas de mulheres e homens como um indicador de diferenças sociais. Eles encontraram “pouca evidência de estilos de vida radicalmente diferentes”. E o fato de que todos os esqueletos tinham resíduos de carbono em suas costelas por passarem tempo em ambientes cheios de fumaça demonstra que as mulheres não estavam mais presas à casa do que os homens. Ele concluiu: “Em geral, há pouca evidência de que o gênero tenha sido muito significativo na alocação de papéis […] Deve ter havido diferenças de estilo de vida em relação ao parto, mas essas diferenças não parecem estar relacionadas a grandes distinções sociais.” Nem as diferenças de vestimenta ou de vida significavam que “um gênero era privilegiado em relação ao outro em termos de transmissão de regras e recursos ou em termos de status social e estilo de vida”.(28)
Um conjunto considerável de estudos antropológicos mostra que, em sociedades como a !Kung e a Mbuti, da África, as mulheres até bem pouco tempo ainda participavam da tomada de decisões em pé de igualdade com os homens, controlavam sua própria sexualidade e contribuíam como iguais para a atividade produtiva (29).
À luz dessa evidência generalizada, à qual acrescentarei mais abaixo, vamos agora nos voltar para a explicação de Engels sobre as origens da opressão das mulheres.
A argumentação de Engels
Engels argumentou que os primeiros seres humanos viviam em pequenos grupos igualitários, o que ele chamou de “comunismo primitivo”, ou às vezes “selvageria” e mais tarde “barbárie”, que podem soar ofensivos para um leitor moderno, mas estavam em consonância com a terminologia arqueológica empregada na época. Ao longo de milhares de anos, os seres humanos encontraram maneiras novas e inovadoras de suprir as necessidades do grupo até que o trabalho de um indivíduo pudesse produzir mais do que o necessário para sua sobrevivência. Isso, Engels afirma, leva a
“a diferenciação da riqueza, o aproveitamento da força de trabalho alheia e, desse modo, a base dos antagonismos de classe: novos elementos sociais que, no decurso das gerações, se esfalfam para adequar a antiga constituição social às novas condições até que, por fim, a incompatibilidade das duas acarreta uma revolução total.
A velha sociedade, baseada em uniões consanguíneas, explode ao chocar-se com as classes sociais recém-desenvolvidas; seu lugar é tomado por uma nova sociedade, sintetizada no Estado, cujas subdivisões são formadas não mais por uniões consanguíneas, mas por uniões locais, uma sociedade em que a ordem da família é inteiramente dominada pela ordem da propriedade…”(30)
A subordinação das mulheres aos homens estava enraizada nesse processo. Engels descreve mudanças na família do casamento por grupo, em que grupos de mulheres e homens podem ter relações sexuais com todos no grupo. Nesse lar comunista, argumenta, as mulheres são altamente valorizadas porque são evidentemente mães de seus filhos, enquanto a paternidade é indeterminada.
Engels afirma que a domesticação de grandes animais produziu o primeiro excedente para além das necessidades da sociedade. Enquanto uma continuação de seu papel de caçador, assumia-se que os homens é quem deveriam ser o responsáveis por essa tarefa, portanto, foram eles quem ficaram no controle deste excedente. O autor esboça um argumento complicado sobre o direito e a herança da mãe através não da família, mas de sua gens (31). Por vários meios, os direitos de herança foram alterados para que a riqueza recém adquirida pudesse ser transmitida através da gens dos homens. Na verdade, Engels cita a pesquisa de Marx sobre alguns índios americanos que pareciam estar em transição, e que estavam mudando a maneira como nomeavam seus filhos: “adotou-se o costume de implantar filhos/filhas na gens do pai, dando-lhes um nome gentílico pertencente a esta [em vez da gens de sua mãe, à qual eles pertenciam anteriormente], para que pudessem herdar do pai”. Marx exclama: “Casuística inata do ser humano a de mudar as coisas mudando-lhes o nome! E encontrar maneiras escusas de romper a tradição a partir da tradição quando suficientemente motivado por um interesse direto!” Isso indica que o direito de herança podia ser alterado para abarcar as novas relações sociais.
Engels afirma que “essa revolução [foi] uma das mais incisivas que a humanidade vivenciou”, essa “derrubada do direito materno representou a derrota do sexo feminino no plano da história mundial”. Dessa forma, se a opressão das mulheres era fundada no surgimento das divisões de classe, as mulheres só se tornariam livres dessa opressão quando as classes deixassem de existir. Engels sabia que não poderia provar como ou quando essas mudanças ocorreram, mas estava confiante de que existiam muitas evidências de que elas haviam acontecido (32).
Está provado que Engels tem toda a razão. Cada vez mais evidências arqueológicas e avaliações revisadas da antropologia das sociedades pré-classe reforçam suas principais proposições. As últimas evidências mostram que durante a maior parte dos 200.000 anos da história do Homo sapiens, eles viveram em sociedades igualitárias. É legítimo, portanto, supor que não houve opressão. Por quais meios alguém imporia discriminação sistemática a qualquer grupo e para que serviria em uma sociedade que dependia da contribuição de todos? Sem um excedente não pode haver camada na sociedade que não seja necessária para contribuir para a produção. E sem exploração, não há base material para a opressão de qualquer setor da comunidade. Quando eu estava fazendo pesquisa no final dos anos 80, os colaboradores de revistas de antropologia que argumentavam que a opressão das mulheres é universal reconheceram instintivamente que teriam que derrotar o argumento mais básico de que a humanidade começou sua vida social em sociedades cooperativas não hierárquicas. Como diz Karen Sacks, uma análise marxista e materialista consistente repousa no entendimento de que “não há mãos ou princípios invisíveis guiando a evolução humana. […] As causas não são externas e independentes da organização social”(33).
A questão é: por que a ascensão das classes levou à opressão das mulheres? Engels teve que trabalhar com evidências que existiam em seu tempo, portanto, aceitou a ideia dominante, mas equivocada, de que apenas os homens caçavam. Também trabalhou com a tese dominante, mas errada, entre os arqueólogos de que o pastoreio de animais produziu o primeiro excedente. Assim, Engels não concluiu injustificadamente que os homens eram responsáveis e, portanto, controlavam esse excedente. Em sua opinião, essa foi a base material para as mudanças nas regras dos direitos e responsabilidades familiares, de modo que as linhagens de descendência e responsabilidade anteriormente matrilineares foram substituídas por herança passada pela linhagem paterna. Para que isso fosse possível, a sexualidade das mulheres tinha que ser controlada, de modo que a paternidade dos filhos fosse clara, ao contrário do passado, quando as mulheres podiam ter vários parceiros sexuais.
A argumentação de Engels no contexto moderno
Então, vamos nos voltar para o que a pesquisa mais recente indica e como isso afeta o argumento de Engels. Evidências reunidas desde a década de 1960, e agora amplamente aceitas como válidas, contradizem praticamente todos os detalhes do argumento de Engels. No entanto, sua proposição central é confirmada de forma ainda mais consolidada, isto é, a opressão das mulheres não é universal, mas está fundamentada na ascensão da sociedade de classes. Resumindo o consenso generalizado que surgiu, Peter Jordan e Vicki Cummings, dois dos editores da edição de 2014 do The Oxford Handbook of the Archaeology and Anthropology of Hunter-Gatherers (doravante The Oxford Handbook), escrevem:
“as comunidades de caçadores-coletores de pequena escala […] com toda a probabilidade, permaneceram sociedades igualitárias, sem diferenças pronunciadas de status social e com poucas evidências arqueológicas da presença de riqueza privada ou do acúmulo de objetos de prestígio.”(34)
Foram necessários dezenas de milhares de anos, até mesmo depois que algumas comunidades conseguiram produzir um excedente, para que emergisse uma classe exploradora, minoritária e apoiada por um Estado. E o processo pelo qual esses desenvolvimentos ocorreram foi muito diferente de como Engels, e até mesmo muitos ainda hoje, explicam. Alguns arqueólogos agora argumentam que as características tecnológicas e sociais anteriormente associadas a sociedades agrícolas totalmente estabelecidas, como grandes populações sedentárias, desigualdades socioeconômicas, escravidão, especialização em artesanato etc., são evidentes em muitas comunidades muito antes do que se pensava. Esses desenvolvimentos tiveram início há 40.000 anos na Europa e se espalharam para diversas partes do mundo nos 20.000 anos seguintes. Brian Hayden, colaborador do The Oxford Handbook, argumenta que “o principal divisor de águas no desenvolvimento cultural não foi a domesticação de plantas ou animais, mas o surgimento de sociedades mais complexas que começaram a se desenvolver já entre os grupos de caçadores e coletores.”(35)
A evidência é dispersa, dependendo de onde os sítios arqueológicos estão estabelecidos. No entanto, observamos desenvolvimentos qualitativos quando a última das camadas de gelo da era paleolítica derreteu. À medida que os rios se avolumavam e os litorais se erguiam devido ao derretimento do gelo, a vida animal proliferava ao longo das margens e costas. Isso propiciou o surgimento de novos ecossistemas com recursos abundantes, como peixes, solo fértil, boas chuvas e similares, o que incentivou as comunidades nômades a se estabelecerem permanentemente ou pelo menos sazonalmente nesses locais. Esses desenvolvimentos aconteceram primeiro, até onde sabemos, na costa nordeste do Japão e na Ucrânia, mais tarde na costa noroeste dos EUA, Anatólia, Austrália e ao longo dos rios no Sudeste Asiático.
Cada vez mais, em todo o mundo, os seres humanos que, até onde sabemos, percorreram vastas distâncias partindo África, estavam fazendo experiências com queimadas, cultivando o solo, capinando, plantando, semeando, irrigando e drenando a terra. Todos estavam gradualmente contribuindo para o aumento da produtividade do trabalho humano (36). Essas sociedades mantinham seus hábitos de forrageamento e caça, mas eram capazes de produzir excedente, mesmo que apenas em tempos difíceis, como a seca. Mas permaneceram comunidades igualitárias e coletivas.
Muitos dos primeiros “exploradores” que lideraram a invasão da Austrália ou aqueles que estabeleceram propriedades em terras aborígenes antes que sua cultura fosse completamente destruída relataram que os povos indígenas produziam grandes estoques de grãos que eram claramente desnecessários para uso imediato. Uma descrição habitual é a de um “celeiro nativo” no rio Finke, no Território Norte. Em uma plataforma construída em uma árvore, a mais de três metros do chão, foram encontrados sacos cheios de grãos. Em outra, no Território Norte foi registrado cerca de uma tonelada de grãos armazenados em pratos de madeira cobertos com casca. Na região central de Nova Gales do Sul, mais um registro de sacos de pele de canguru cheios de grãos. Os europeus não conseguiam explicar esse comportamento; por que alguém deixaria aqueles estoques de grãos nutritivos e deliciosos sem proteção? Para eles, apenas pessoas sedentárias e civilizadas “cultivavam”. Mas as comunidades aborígenes eram semi-sedentárias, construindo casas às vezes onde se estabeleciam enquanto colhiam ou gerenciavam uma determinada área de terra. Eles podiam deixar seus celeiros sabendo que estariam intactos quando voltassem das caminhadas por suas terras, algo que as pessoas da sociedade de classes simplesmente não conseguiam entender (37).
As conclusões de Hayden são proporcionais à explicação de Marx e Engels sobre a mudança social: “percebe-se que há uma relação importante entre a produtividade dos recursos e a produção excedente, por um lado, e a complexidade sociopolítica, por outro”.(38)
E assim, depois de pelo menos 150.000 anos, essa criatura que havia evoluído de hominídeos primitivos de milhões de anos atrás – que agora se sabe terem cruzado com neandertais que, ao contrário das suposições iniciais, tinham práticas sociais e culturais complexas – começou a se dividir entre aqueles que produziam as necessidades da sociedade e uma minoria que vivia do trabalho da maioria. “A derrota do sexo feminino no plano da história mundial”, como disse Engels, não foi um evento único. Engels concordaria facilmente com as últimas conclusões obtidas pelos arqueólogos, pois elas são tão claramente comparáveis com suas abordagens e as de Marx. Ambos entenderam que a sociedade estava sempre em constante processo de mudança. Pequenos desenvolvimentos na forma como a produção é organizada se acumulam e alteram gradualmente a forma como as pessoas se relacionam umas com as outras. Engels comenta que as mudanças ocorreram ao longo de milhares de anos, de modo que suas consequências a longo prazo não teriam sido evidentes para qualquer indivíduo. Foram necessários milhares de anos para que as classes dominantes e os estados se estabelecessem, o que ocorreu apenas há cerca de 8-10 mil anos atrás, enfatizando que não há nada natural na exploração e opressão entre os seres humanos.
Desde que comecei a analisar as evidências na década de 1980, sinto-me desconfortável com alguns aspectos da explicação de Engels. Isso levanta uma questão crucial que não foi abordada nem por seus detratores, nem por seus defensores. Se famílias ou linhagens inteiras se tornaram uma classe dominante, qual era o papel das mulheres nisso? A sociedade que estava passando por esse desenvolvimento era igualitária, na qual todos os membros, mulheres e homens, participavam de importantes tomadas de decisão. Então, por que as mulheres dessa camada social simplesmente deixaram os homens assumirem o controle? É improvável que elas não tenham desempenhado nenhum papel na concretização de algumas das mudanças ou na resistência a elas, possivelmente em ambos os casos em momentos diferentes. Portanto, quero esboçar um relato diferente, não original em todos os seus aspectos, mas incluindo um que acho que ninguém apresentou antes, que reconhece que as mulheres foram participantes ativas no desenvolvimento das divisões de classe que levaram à opressão sistemática das próprias mulheres.
Desenvolvimento dos debates e evidências
Primeiro, vale a pena resumir alguns argumentos e debates relevantes nas últimas quatro décadas entre feministas e marxistas. Na década de 1970, algumas feministas começaram a contestar os relatos que presumiam o domínio dos homens nas sociedades de coletores-caçadores. As melhores delas, algumas mencionadas anteriormente, descobriram que as mulheres desempenhavam um papel construtivo e produtivo como coletoras, o que as colocava em pé de igualdade com os homens. Karen Sacks foi um exemplo típico. Ela observou que, em algumas sociedades de caçadores-coletores, as mulheres adaptam o número de gestações às necessidades de produção. Também mostrou que as mulheres !Kung na África não fazem pausa na coleta enquanto amamentam seus bebês, o que, segundo ela, “atesta a centralidade cultural das funções produtivas das mulheres, além de contrariar um determinismo reprodutivo simplista”.(39)
Estes foram estudos muito úteis, pois estabeleceram que as origens da opressão das mulheres devem ser buscadas em desenvolvimentos históricos e sociais. No entanto, reforçam a imagem do homem, o caçador, e da mulher, a coletora, apenas reformulando-a para mostrar que as mulheres desempenhavam um papel fundamental nas primeiras sociedades, o que lhes dava igualdade de posição com os homens. Mais recentemente, a suposição de que havia uma divisão rígida de trabalho entre homens e mulheres foi questionada. A arqueóloga feminista Rosemary Joyce comenta que alguns arqueólogos começaram a perceber que as suposições dos pesquisadores muitas vezes “os levavam a ver o passado como uma versão do presente”, e que é errado presumir que o gênero é “atemporal e mais importante do que qualquer outra distinção social”. A autora também observou que os avanços na análise de DNA de esqueletos revelaram que as alocações de gênero por associação com roupas ou ocupação, como era a prática usual, estavam erradas.(40) Dois etnoarqueólogos, em artigo publicado no The Oxford Handbook, também desafiam fortemente todas as antigas suposições sobre a divisão de trabalho por gênero:
“Pesquisas de campo atualizadas revelam que a divisão do trabalho era muito variável e mais flexível do que normalmente se supõe, tanto dentro quanto entre as populações […] A divisão do trabalho ocasionalmente se dava de acordo com a idade, a capacidade e a experiência, entre outros fatores, e não apenas de acordo com o gênero.”
Os autores comentam que “uma crescente literatura etnográfica documenta a realidade simples, mas inegável, de que as mulheres também caçavam”; e caçavam uma ampla gama de animais de diversos tamanhos. “Embora às vezes o trabalho pareça estar dividido de acordo com o gênero, há também vasta evidência de que o trabalho e as atividades desempenhadas pelos homens e pelas mulheres estavam amplamente interligados, ou de que a organização do trabalho e do espaço não se baseava apenas em gênero.” Também argumentam que a distinta atribuição das ferramentas e utensílios entre homens e mulheres apontadas nas descobertas arqueológicas não é confiável, pois pode facilmente reproduzir o viés dos pesquisadores (exemplos disso são os documentos de Joyce). Mas o mais importante é que os pesquisadores afirmam que a ênfase no momento da captura e assassinato da caça é enganosa. É importante observar que as armadilhas, arapucas e outras construções reduziam os perigos e dificuldades inerentes à caça: “O repertório completo de tecnologias e estratégias de aquisição, sem dúvida, exigia o trabalho complementar de mulheres, homens e crianças”. Também comentam que pouca atenção é dada ao momento em que se segue à captura: preparar alimentos, roupas, utensílios, fios, ou seja, muitas das atividades que as mulheres poderiam realizar enquanto grávidas ou amamentando, e concluem:
“Levando a questão adiante, pode-se notar a predominância de mulheres na fabricação de artigos de couro e guarda-roupas de pele, tripas e couro sob medida sofisticados, o que permitiu que os povos caçadores-coletores vivessem e trabalhassem em ambientes frios. Argumentos simplistas sobre a “marginalização” das mulheres e/ou o “alto prestígio” dos homens tendem a definhar diante de tais verdades comportamentais […]
Um ponto crítico é que, embora os homens possam ter papéis insignificantes ou limitados em algumas atividades de interesse econômico vital, essas limitações raramente são reconhecidas ou usadas para revisar ideias consolidadas sobre a divisão sexual do trabalho. Pelo contrário… a profissão tem um histórico de interpretar a sociedade de caçadores-coletores em termos de marginalização e exclusão das mulheres.”(41)
Assim, repetindo: as evidências não indicam que os homens teriam tido automaticamente o controle de qualquer excedente criado pela domesticação de animais; os primeiros excedentes foram provavelmente o resultado de uma melhor produção de vegetais, frutas, grãos e/ou pesca, atividades nas quais ninguém contesta que as mulheres desempenharam um papel ativo. Nem o domínio dos homens pode ser explicado pelo uso do arado pesado, como muitos argumentam, porque as sociedades de classes e a opressão das mulheres surgiram nas Américas, antes de sua introdução.
Para além de Engels
Para explicar como a opressão das mulheres se tornou parte integrante das sociedades de classes, precisamos descobrir a relação entre os desenvolvimentos objetivos na produção e as mudanças que isso trouxe nas relações sociais, incluindo como a reprodução foi reestruturada.
Os caçadores-coletores e pescadores começaram a se estabelecer pelo menos sazonalmente em alguns locais onde podiam produzir algum excedente e, ao mesmo tempo, continuar sendo igualitários. O controle do excedente era alocado a indivíduos ou grupos de confiança, talvez figuras religiosas – qualquer uma delas poderia ser uma mulher. Elas desempenharam um papel social necessário envolvendo responsabilidades recíprocas, coordenando métodos de produção cada vez mais complexos, armazenando e distribuindo recursos conforme necessário. Por milhares de anos, isso não conferiu aos responsáveis pelo excedente um poder indevido, respaldado pelos poderes coercitivos de um Estado, mesmo que ocupassem uma posição elevada e possuíssem acesso a riquezas excepcionais. Então, como explicamos o que mudou e por que isso resultou na dominação das mulheres pelos homens?
Entre as caçadoras-coletoras nômades, era importante que nenhuma mulher fosse responsável pelo cuidado de mais de um bebê por vez e, portanto, as mulheres espaçavam o parto em torno das necessidades produtivas. Em contraste, nas sociedades sedentárias, as crianças eram potenciais produtores. Há também a necessidade de compensar uma maior taxa de mortalidade, advinda de uma maior vulnerabilidade a doenças infecciosas, e a possibilidade de guerras sobre os recursos que são armazenados. Assim, quanto maior a taxa de natalidade, mais bem sucedida é a sociedade.
É do interesse de todos que as mulheres não participem de atividades que as exponham a riscos de morte, infertilidade ou aborto (como guerras, viagens de longa distância ou tarefas agrícolas pesadas) – ou que exponham os bebês dependentes do leite materno ao perigo. Então, gradualmente, o papel das mulheres deixa de ser central para a produção, se tornando essencial para a reprodução nas sociedades de caçadores-coletores e nas primeiras sociedades que viviam da horticultura. Com o passar do tempo, elas são excluídas de alguns aspectos da produção. A antropóloga Ernestine Friedl encontrou evidências de que em sociedades de horticultura, onde os homens viajam longas distâncias devido ao comércio e se envolviam em guerras, sua posição era superior em relação às mulheres. E quero enfatizar que as mulheres nesse processo tinham poder de decisão. Cada passo nesse caminho era pequeno e progressivo. Como Engels enfatizou, os indivíduos não sabiam qual seria o efeito cumulativo a longo prazo.
Em Çatalhöyük, na Anatólia – uma comunidade estabelecida, embora não dividida em classes, que existiu até 1.400, entre 7.400 e 6.000 a.C. – como o incentivo (ou talvez simplesmente como a possibilidade) de as mulheres terem mais filhos do que na sociedade nômade, Ian Hodder observa: “os papéis de gênero podem ter se tornado mais demarcados como parte de mudanças mais amplas na sociedade […] Homens e mulheres podem estar cada vez mais associados a tarefas e esferas especializadas”.(42)
Assim, com as mulheres tendo mais filhos e cada vez menos envolvidas em algumas áreas da atividade produtiva, surge uma nova ênfase nas relações entre as sucessivas gerações de homens ligados à terra e outros meios de produção. Como Harman conclui: “A patrilinearidade e a patrilocalidade começaram a se encaixar na lógica da produção muito mais do que a matrilinearidade e a matrilocalidade”. Podemos dizer agora que aqueles caçadores-coletores transigualitários sobre os quais Hayden escreve, estabelecendo-se em áreas de abundância, experimentariam o início desse processo. É importante ressaltar que, como Harman, mas não Engels, observa, nem todos os homens conseguiram o controle de qualquer excedente, apenas aqueles em um grupo dominante emergente.
Para que esse grupo desenvolvesse a mentalidade dos exploradores, eles precisavam relacionar seu controle sobre a produção com os interesses da sociedade como um todo. Entretanto, não pensavam em si mesmos como um grupo introduzindo relações opressivas. E aqui quero divergir tanto de Engels quanto de Harman, cujos argumentos são comumente aceitos pelos marxistas.
As mulheres desse grupo poderiam muito bem ter concordado que sua linhagem familiar, independentemente de como fosse organizada, deveria manter o controle da riqueza da qual estavam encarregadas. Assim como os homens do grupo dominante poderiam muito bem querer garantir que a paternidade de seus filhos fosse clara, a fim de passar a responsabilidade pela produção e controle da riqueza, as mulheres também poderiam se associar a eles. Dizer que nesse grupo dominante emergente apenas os homens tinham voz, não é convincente, visto que na sociedade em transformação acredita-se que ambos as mulheres e os homens contribuíam na tomada de decisões importantes. O interesse em alterar as linhagens de herança era tanto das mulheres quanto dos homens. O papel das mulheres mudou, e não porque o excedente foi criado pelo pastoreio que colocou os homens no controle, mas porque com o aumento do número de nascimentos, fazia sentido que linhagens de herança e responsabilidade pela produção e controle de excedentes passassem pela linhagem masculina.
O argumento de Engels de que a imposição de regras onerosas poderia ter provocado resistência raramente é levado em consideração e, portanto, a evidência dessa possibilidade não é levada em conta. Certamente, o notório Código de Hamurabi, de cerca de 1.717 a.C. – escrito pelo rei babilônico de mesmo nome e fundamentado em leis ainda mais antigas das novas sociedades de classe da Mesopotâmia – previa a monogamia para as mulheres sob pena de morte, e a impunha a regra de que as mulheres que resistissem à sua subordinação “deveriam ter seus dentes esmagados com tijolos queimados”. O rei “tendia a exigir penas mais severas para determinadas ofensas, especialmente para ofensas contra a sacralidade da família”.
A existência deste Código indica que as tentativas de oprimir as mulheres, pelo menos por vezes, encontraram resistência que, por sua vez, foi esmagada com uma força implacável.(43) Algumas mulheres mais conscientes poderiam muito bem ter participado na imposição de tais controles sobre a atividade sexual de membros rebeldes de seus círculos.
Embora o resultado mais dramático dessa reorganização social tenha sido a opressão das mulheres, isso não teria sido evidente nem para os grupos dominantes incipientes, nem para aqueles que eram governados. Como Engels argumentou, esses desenvolvimentos aconteceram ao longo de centenas, se não milhares de anos, causando uma série de mudanças, muitas das quais teriam consequências imprevistas. Houve uma reviravolta na vida social, cultural e política, assim como qualquer mudança importante na capacidade produtiva da sociedade gerou nos milhares de anos desde então. Como as mulheres não haviam sido oprimidas, ninguém teria previsto um resultado tão devastador.
O argumento sobre a evolução a longo prazo das estruturas de classe e de estado pode parecer um processo teleológico sem costura – muito sem costura. Há evidências de que os grupos dominantes emergentes poderiam muito bem ter encontrado resistência. Assim, para manter sua autoridade sobre o controle do excedente, provavelmente teriam começado a regular as obrigações e os direitos dos membros da comunidade. E à medida que se tornavam mais controladores, com sua posição cada vez mais enraizada por regras e leis, as expectativas da sociedade iam se alterando. Gradualmente, qualquer desafio a esse grupo teria se tornado um crime não apenas contra eles como indivíduos, mas um crime contra a sociedade.
Uma série de cidades neolíticas na Anatólia, que permaneceram igualitárias e dependentes da coleta e da caça, foram ocupadas por milhares de pessoas entre 10.000 e 7.000 a.C. No entanto, gradualmente, elas exibem sinais de hierarquias. Acredita-se que Göbekli Tepe, que existiu de 9.600 a 8.000 a.C., seja um centro cerimonial, sem casas para moradia. Isso sugere a existência de uma elite religiosa cujo domínio se estendia por uma vasta área.
E há evidências de que houve resistência ao desenvolvimento de hierarquias. O arqueólogo turco Mehmet Ozdogan, que trabalhou nesses locais, acredita que houve uma revolução social por volta de 7.200 a.C. que derrubou uma elite dominante em Çayönü, seguida por revoltas revolucionárias semelhantes em toda a região circundante. Em um e-mail privado que me enviou em 2011, Ozdogan escreve: “Estou quase certo de que houve algum tipo de turbulência social [nesse período], não apenas em Çayönü, mas na maior parte da área central da Anatólia neolítica.” Bernhard Brosius, que estudou as sociedades neolíticas da Anatólia e dos Balcãs, concorda.
Certo dia, cerca de 9.200 anos atrás, as casas senhoriais foram incendiadas. O templo foi demolido, queimado, e convertido em um depósito de lixo municipal. As favelas no Oeste desapareceram definitivamente. O novo Çayönü foi erguido. Casas e barracos de baixo padrão já não eram mais construídos. Todos os indícios de desigualdade sociais foram apagados.(44)
O autor argumenta que em Çatalhöyük isso resultou em uma sociedade sem classes, com tradições que duraram pelo menos mil anos.
James C. Scott, em seu livro Against the Grain, resume evidências sobre a história dos primeiros estados da Mesopotâmia. As explicações mais populares dos arqueólogos sobre o colapso de muitos estados iniciais são invariavelmente as mudanças climáticas, a degradação ambiental e as pressões populacionais. Scott aponta que, se não houve rebeliões diretas, a fuga para comunidades vizinhas que não estavam sujeitas à tributação e ao controle do estado foi um fator que contribuiu para esse colapso. É comum se pensar que as muralhas foram inventadas para impedir a invasão de saqueadores “bárbaros”, mas há arqueólogos que argumentam que elas foram inventadas para impedir as pessoas de saírem das cidades.(45)
À medida em que os grupos dominantes se esforçavam em afirmar sua autoridade e controle sobre as sociedades em decorrência à resistência crescente, o controle sobre a sexualidade das mulheres precisava ser imposto. Isso era fundamental para que eles consolidassem sua posição e a de seus descendentes como proprietários do excedente produzido pela sociedade. Tanto as mulheres quanto os homens resistiram a todos esses passos na derrubada do igualitarismo. E assim termina um ciclo cada vez mais repressivo com a mulher como “mero instrumento de procriação”, como afirmava Engels.(46)
Se é difícil imaginar mulheres participando da formação de um grupo dominante que enfatizava o controle da sexualidade feminina e as restrições compulsórias que isso acarretava, não se aventure pare além da história já conhecida. Figuras atuais como Margaret Thatcher, Hillary Clinton e Gina Rinehart enfatizam esse ponto. Para não falar de Françoise Bettencourt Meyers, herdeira da L’Oréal, cuja fortuna de 43,9 bilhões de dólares vem de uma indústria que incentiva a obsessão feminina com a aparência e posteriormente se alimenta dessa ansiedade gerada. Alice Walton, herdeira da fortuna do Walmart nos EUA, acumulou seus 46,6 bilhões de dólares pagando salários miseráveis a uma força de trabalho majoritariamente feminina.
Essas mulheres promovem estereótipos que justificam a discriminação sistemática, mesmo que contra si mesmas dentro de seus círculos, a fim de manter o poder e o domínio de sua classe. Assim, é possível concluir que as mulheres poderiam muito bem ter participado na imposição deste novo regime. Embora sofram opressão, elas também têm acesso ao poder e à riqueza em virtude de sua posição de classe, que depende da manutenção da opressão de classe e de gênero daqueles que sua classe explora.
Além disso, a maioria das mulheres de hoje, de todas as classes sociais, desempenha um papel na imposição, no reforço ou na perpetuação da opressão feminina em algum grau. Em geral, são as mães, por exemplo, que incutem nas meninas as normas de uma sociedade sexista e que defendem com mais veemência os valores sociais da família, da respeitabilidade etc. Não há nada de orgânico no fato de os oprimidos se oporem, resistirem ou mesmo estarem conscientes da forma como sua opressão se manifesta.
Como Marx e Engels argumentaram, as ideias da sociedade são necessariamente as ideias da classe dominante. Assim, uma vez que os círculos dominantes aceitaram novas atitudes em relação às mulheres, eles naturalmente impuseram essas ideias aos explorados, apoiados pelo fato de que os homens explorados poderiam estar produzindo uma porcentagem cada vez maior do excedente, enquanto as mulheres estavam sendo incentivadas a ter mais filhos como futuros trabalhadores a serem explorados.
Conclusão
Marx argumenta nas Teses sobre Feuerbach que, à medida que os humanos trabalham – produzindo comida, roupas e abrigo necessários – eles transformam a si mesmos. Mudanças cumulativas graduais dão origem a novas relações que envolvem esse meio de produção, desafiando antigas ideias e relações sociais.
Os detalhes de Engels estavam completamente equivocados. O autor não sabia quase nada sobre caçadores-coletores nas sociedades anteriores, a não ser pelos relatos escassos sobre a Austrália. Os índios americanos, cujos estudos conferiu, já haviam sido afetados pela ocupação colonial. Então, discutiu sobre as mudanças que ocorreram quando as tribos alemãs invadiram o império romano. Isso, entretanto, não é diretamente relevante se quisermos conhecer as primeiras sociedades que fizeram a transição para a exploração, o estado e a opressão das mulheres. Tudo o que Engels nos fornece são dicas, das quais fez deduções, e que forneceram algumas evidências de como as estruturas familiares poderiam mudar ao longo do tempo quando mudanças mais amplas ocorriam.
O fato é que, quando nos voltamos para as pesquisas mais recentes, os argumentos de Engels, assim como seu argumento sobre o próprio desenvolvimento da humanidade, são mais claramente fundamentados hoje do que quando escreveu o livro. O autor estava certo ao supor que as mudanças envolviam aumentar o controle sobre a sexualidade das mulheres para que a paternidade dos filhos fosse conhecida. Essas mudanças surgiram da interação das necessidades biológicas de reprodução da sociedade e da mudança das relações sociais de produção – mas não da maneira como Engels e, aliás, como marxistas e feministas ainda explicam.
Para que o controle do excedente por uma nova classe dominante, vivendo do trabalho da maioria, se tornasse a norma, era necessária a opressão da maioria tanto das mulheres quanto dos homens. A sexualidade das mulheres na elite dominante estava sujeita a novos controles, a fim de garantir a herança da propriedade por sua classe. Ao longo do tempo, a desigualdade das mulheres tornou-se arraigada em todas as classes, dando origem a novas ideias opressivas sobre a “natureza” das mulheres e a sexualidade em particular, mas de forma que também impôs estereótipos aos homens. As maneiras pelas quais essa opressão foi mantida variaram em diferentes sociedades de classe; mas mantiveram-no, seja qual for o verniz cultural que a rodeia. A ascensão das classes, o estabelecimento de um estado e a opressão das mulheres não foi um processo brando e inevitável; estava repleto de possibilidades de resistência e turbulência, como a ampla descrição de Engels do processo deixa claro, ao contrário daqueles como Heather Brown que rejeitam seu relato como linear e não dialético:
“é sob essa estruturação social baseada em laços consanguíneos que se desenvolve gradativamente a produtividade do trabalho e, com ela, a propriedade privada e a troca, a diferenciação da riqueza, o aproveitamento da força de trabalho alheia e, desse modo, a base dos antagonismos de classe: novos elementos sociais que, no decurso das gerações, se esfalfam para adequar a antiga constituição social às novas condições até que, por fim, a incompatibilidade das duas acarreta uma revolução total. A velha sociedade, baseada em uniões consanguíneas, explode ao chocar-se com as classes sociais recém-desenvolvidas; seu lugar é tomado por uma nova sociedade, sintetizada no Estado, cujas subdivisões são formadas não mais por uniões consanguíneas, mas por uniões locais. (47)
Cabe aos marxistas e feministas defender ou refutar Engels com base nas últimas conclusões científicas confiáveis.
A clara divisão de gênero do trabalho que todos assumiam não é mais uma avaliação viável das primeiras comunidades humanas. Assim, os homens não se apoderaram apenas de um excedente criado pela domesticação de animais. Então, o processo pelo qual o excedente mais antigo foi produzido antecede o pastoreio em muitos lugares e foi o resultado de um processo mais multifacetado e complexo do que apenas domesticar grandes animais. Em Çatalhöyük não há evidências de pastoreio, mesmo em uma cidade estabelecida, mas havia armazenamento de alimentos vegetais, indicando que pelo menos algum excedente foi produzido por outros meios.
E referi-me a outras evidências de excedente mesmo entre comunidades seminômades sem animais domesticados para consumo.
Em segundo lugar, não eram apenas os homens que tinham controle sobre a riqueza que era armazenada para épocas de escassez. Famílias ou linhagens confiáveis, talvez até líderes religiosos, qualquer um dos quais poderiam ter sido mulheres, receberam voluntariamente a responsabilidade de gerenciar e distribuir o excedente. No início, isso não envolvia nenhum poder indevido. No entanto, estabeleceu a base para o eventual domínio de uma minoria com riqueza e poder, que era defendida com cada vez mais força por um aparato estatal.
Em terceiro lugar, as mulheres nesse grupo dominante emergente teriam ganho poder e prestígio, bem como os homens. As mulheres estavam acostumadas a participar da tomada de decisão coletiva. Portanto, não é possível ignorar o papel que as mulheres teriam desempenhado na mudança das regras que regiam a comunidade, incluindo a imposição de novos controles sobre a sexualidade das mulheres na minoria cada vez mais arraigada no controle do excedente. Uma vez que uma classe dominante foi estabelecida, então sua ideologia de monogamia teve que ser imposta à maioria, assim como a ideologia de competição individualista dos capitalistas domina não apenas seus círculos de elite, mas é propagada como a norma para toda a sociedade.
A vitória final das classes dominantes foi, como disse Engels, a derrota do sexo feminino no plano da história mundial, mas também foi uma derrota drástica para a grande maioria da humanidade. Como comenta Engels, a partir de então, uma vez que os estados foram estabelecidos para defender esses grupos dominantes, cada passo adiante da humanidade – como a melhoria da produção, o desenvolvimento da ciência, da escrita e da cultura – ocorreu, e ainda acontece, às custas da grande maioria, dos explorados e oprimidos.(48) Para eles, mulheres e homens, a libertação só será possível quando toda a estrutura de classe for destruída.
Notas:
(1) Este artigo foi amplamente influenciado por mais de uma década de discussões sobre a opressão das mulheres na Alternativa Socialista por muitos camaradas, tanto mulheres quanto homens. Mick Armstrong e Louise O’Shea, em particular, ajudaram a formular os argumentos aqui resumidos.
(2) Engels 1972, p. 113.
(3) Sacks, 1982, p.104.
(4) Lerner, 197, p.23.
(5) Marxist International Archive, marxist.org.
(6) Engels, 1977, p.163.
(7) Sayers et al (eds) 1987 para uma série de críticos que apresentaram artigos em um simpósio para marcar o centenário da publicação do livro e Bloodworth 2010, pp. 76-79, para minha resposta a alguns deles.
(8) Harman, 1994.
(9) de Beauvoir, 1987 [1949], pp. 93 e 97.
(10) Browmillier, 1986. Para minha crítica ao seu livro, Bloodworth, 1992.
(11) Browmiller, 1986, pp.11-18.
(12) Browmiller, 1986, p.286.
(13) Brown, 2012, pp.170-173. Consulte McGregor, 2015, para uma excelente revisão de Brown. McGregor refuta praticamente todos os argumentos de Brown contra Engels. Ela também descreve as fraquezas e erros em Raya Dunayevskaya, nos quais Brown confia fortemente em seu argumento de que Engels não apresentou as ideias de Marx corretamente.
(14) Brownmiller 1986, p. 13.
(15) Sally Slocum “Woman the Gatherer: Male Bias in Anthropology”, em Reiter, 1975, p. 44
(16) Tanner; Zihlman, 1976.
(17) Leacock 1981, Capítulos 11 e 12 para uma crítica de Lévi-Strauss; Sacks 1982, pp. 1-67; Dahlberg 1981.
(18) Bloodworth n.d.
(19) Moore 1991, pp. 38-41.
(20) Dahlberg 1981, p. 21.
(21) Brown 1970, p. 1074.
(22) Reiter 1977.
(23) Etienne e Leacock 1980, documentam os efeitos da dominação colonial em 12 sociedades, com base em relatos de missionários, exploradores e comerciantes e outros materiais históricos.
(24) Reynolds 1981, p. 145.
(25) Bloodworth n.d.
(26) Leacock 1978; Leacock, 1981.
(27) Leacock 1978, p.255.
(28) Hodder 2006, p211.
(29) Consulte Sanday e Goodenough (eds) 1984.
(30) Engels 1972, p. 72.
(31) O uso de “gens” mudou com o tempo. Engels usa isso para se dirigir a um grupo muito mais amplo do que uma “família” imediata, alegando descendência de um ancestral comum e unido por um nome comum traçado através da linhagem materna. Mais tarde, foi usado para se referir aos grupos patriarcais de famílias na Roma antiga.
(32) Engels 1972, pp. 112-120.
(33) Sacks,1982, p. 104.
(34) Peter Jordan e Vicki Cummings, “Introduction to Prehistoric Hunter-Gatherer Innovations”, em Cummings et al (eds) 2014, p. 590
(35) Brian Hayden, “Social Complexity”, em Cummings et al (eds) 2014, p. 643.
(36) Jennie Robinson, “The First Hunter-Gatherers”, em Cummings et al (eds) 2014, p. 600.
(37) Gammage 2012, Capítulo 10, “Farms without fences”, pp. 281-304.
(38) Hayden, “Social Complexity”, em Cummings et al (eds) 2014, p. 646
(39) Sacks 1982, pp. 70-71.
(40) Joyce 2008, pp. 24 e 51; Greenberg 1988, para uma discussão de gênero/s nas primeiras sociedades, especialmente a Parte 1.
(41) Robert Jarvenpa e Hetty Jo Brumbach, “Hunter-Gatherer Gender and Identity”, em Cummings et al (eds) 2014, pp. 1244-1248.
(42) Hodder 2006, pp. 210-211 e 218.
(43) Rohrlich 1980
(44) Bernhard Brosius 2004, “From Çayönü to Çatalhöyük. Emergence and development of an egalitarian society”, citado em Choonara e Harman 2009, p. 223
(45) Scott, 2017, pp. 232-234.
(46) Engels 1972, p. 120.
(47) Engels, 1972m 99.71-2, grifo nosso.
(48) Engels, 1972, p. 226.
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Sandra Bloodworth é editora da Marxist Left Review, e escreveu sobre Lênin e a Revolução Russa de 1917, economia marxista, opressão feminina e sexual e sociedades pré-classe.